COMPARAÇÕES...

Percebo que todas as vezes que estou comentando algum fato ou contando algum caso, o meu filho mais velho fica com cara de riso. Um dia lhe perguntei por que ele estava com aquela expressão, se acaso era por não estar acreditando no que eu estava falando. Ele disse que não era nada disso, estava achando graça, apenas isso. Hoje, vendo que ele ria muito, falei:

— Parece que você não está me levando a sério! Isto aconteceu de verdade! Não estou inventando.

Ele riu mais ainda e acabou me explicando o motivo.

— Fico ouvindo as suas palavras e não posso deixar de compará-las com as de outras pessoas. As suas são ricas em detalhes, sentimentos e contemplações... Você vê o fato, interioriza este fato e quando vai expô-lo, ele fica repleto de observações, interpretações e passa a ter um pouco de você.

Achei muito interessante a sua justificativa e falei:

— Mas se você gosta por que fica com esta cara de quem não está acreditando!?

Mais uma vez, ele explicou:

— Vivo no meio de pessoas com mentes voltadas para cálculos, coisas muito racionais, lógicas. Pessoas que lidam com números e máquinas e, em consequência a isso, a forma com que elas narram algum fato, explicam alguma coisa, é tão diferente da sua. É tão grande esta diferença que acabo achando graça nas suas narrativas.

Só aí foi que compreendi e falei:

— De fato as minhas palavras escritas ou faladas são moldadas nos meus sentimentos e é esta a razão de transmitirem esta linguagem carregada de emoção. Se eu não fosse assim, não conseguiria escrever poesias, enfim textos líricos.

Enquanto escrevia sobre isto, veio-me a lembrança um caso acontecido na minha infância passada na fazenda. Eu tinha uma prima que gostava de ficar conosco as férias inteiras. Ela ia assim que as férias começavam e só regressava às vésperas do início das aulas. Combinávamos muito, dormíamos no mesmo quarto. Para mim não havia nada melhor porque eu não tinha irmã e me sentia às vezes muito sozinha. Eu achava curioso observar como o seu sono vinha rápido, ela ia deitando a cabeça no travesseiro e logo estava dormindo. Muitas vezes eu estava conversando e, quando olhava para o seu lado, percebia que estava falando sozinha, pois ela já caíra no mais profundo sono. Ao contrário dela, eu custava a dormir e ficava pensando muitas coisas, imaginando outras, repassando algum acontecimento pela mente até que era vencida pelo sono. Assim que acordávamos, eu ia contar o que havia sonhado e ela ficava calada. Um dia li em uma revista que os pesquisadores haviam descoberto que as pessoas que tinham sonhos a cores possuíam um grande diferencial em relação as que sonhavam em preto e branco. Era algo bastante positivo sonhar colorido e constatei que os meus sonhos eram assim.

Um dia lhe perguntei como eram os dela.

— Não sei, eu não sonho – ela me respondeu.

Depois disso, comecei a me comparar com ela em muitas coisas e cheguei a conclusão de que ela tinha algum problema. Nunca falei isso, mas pensava: “Coitada, ela não é normal!”. Muitos anos depois, vendo muita coisa, lendo muito, descobri que ela era normal, eu é que não era. O dia que descobri isso passei a me compreender melhor.

Déa Miranda
Enviado por Déa Miranda em 08/08/2013
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