O JULGAMENTO DO MASSACRE DO CARANDIRU

Temi que a condescendência da sociedade ( acuada e atemorizada por tanta violência) fizesse eco no tribunal do júri, minimizando as penas dos réus daquele genocídio indesculpável. Por piores históricos de vidas daqueles condenados, eles se encontravam sob a tutela do Estado, aprisionados, sendo a reação policial desproporcional em força e armamento contra eles. Mesmo que alegações trouxessem como pífio argumento de que alguns portavam estiletes improvisados, o que significaria tais artefatos contra os fuzis e metralhadoras, e ainda com ferozes cães treinados e prontos para o ataque ? Boa parte dos mortos encontravam-se nus, o que põe em xeque a possibilidade de portarem qualquer arma que pudesse ameaçar a força policial. Temi, também, por serem tidos como párias da sociedade, elementos à margem da vida, para muitos, estorvos, cuja ação foi bem vinda, recordo-me naqueles idos, de faixas de congratulações e de apoio aos atiradores. A massa presidiária, em recente censo, são de pessoas oriundas de estratos sociais baixos, com pouca, ou nenhuma, escolaridade - eram, já, portanto, excluídos, mesmo libertos das grades. Ocorre que muitas testemunhas, convenientemente, diga-se, alegaram não se recordar de fatos ocorridos há mais de 20 anos, como se presenciar assassinatos em massa fosse coisa corriqueira, banal, que sequer os tenha impressionados a ponto de não se recordarem muito do acontecimento. Claro, era a massa humana, refugo da sociedade, seres menores, insignificantes mesmos, no entender do silêncio e do descaso. Também a morosidade da Justiça conspirou para este desleixo, desconsiderando sua importância histórica, de triste lembrança, foram 111 mortes, por que, pergunto, levarem mais de duas décadas para realizarem o julgamento ? Possivelmente para se retirar das retinas e da possível indignação dos mais sensíveis, em benefício do Estado e de seus agentes criminosos. Assim, a alegação cínica de não se lembrarem de detalhes é convincente, afinal passados tantos anos. Embora os condenados, mesmo respondendo a princípio em liberdade, com seus recursos, o Estado de onde emana toda a autoridade passará ileso, restando a alguns policiais as penas desse episódio humilhante de nossa história. Cadê os comandantes, o Secretário de Segurança e o Governador Fleury Filho, no banco dos réus? Bem, isso já é pedir demais no Brasil...