POLITICA SOCIAL E POESIA


Nas questões políticas que comento, meus vômitos políticos se juntam à quimera das minhas poesias.

Nasci um poeta, reconhecido ou não, lá nos côncavos de um sertão, onde tinha cachoeira em que eu brincava nos domingos, descendo o lajeado em cachopas de coqueiros. Lá aprendi a me embebedar nos cantos dos sabiás sobre o que hoje componho poemas, mas que na época, por si só, eram poesias.

Lá eu sonhava crescer, lambuzar-me com a água encanada e a luz elétrica das cidades grandes, onde conheceria uma mulher linda e numa casa imensa, num jardim imenso pipocado de flores urbanas, eu a beijaria e ela se abraçaria a mim e se dependuraria no meu pescoço com quem viveria felicidade plena e infinita.

Lá eu aprendi a conhecer os dois lados da vida social. De um lado os caipiras pobres que se juntavam em serões nos engenhos, para fazer a farinha um ou outro. Lá assistia um caipira matar um porco e dividir a carne com os vizinhos e certo de que receberia o mesmo agrado e recebia, sem dúvida. Lá escutava homens usando o bigode para fazer valer o combinado, fio a fio, palavra a palavra.

E lá também já aprendi a conhecer os coronéis afortunados do lugarejo que exploravam a todos esses caipiras, grilando suas terras, impondo preços aviltantes pelo mantimento, pagando diárias vis pelos serviços que prestavam/contratavam. Lá, ainda menino e já poeta, sonhava um grande amor e sonhava ver os homens simplesmente vivendo na verdadeira irmandade, daquele jeito que os pastores mencionavam ditos de Cristo, nos cultos domingueiros que eu assistia a contra gosto, puxado pelas barras da saia de chita da minha mãe.

E cresci, mudei para a cidade grande, iludi-me com o fulgor da luz elétrica, com o farto jorrar da água encanada, com o cinema, os mocinhos dos faroestes, as músicas apaixonantes do Roberto Carlos. Fiquei letrado e aprendi até o que não queria.

Conheci e vivi muitos amores, acolhi belas damas em meu peito, que até se dependuraram em meu pescoço, mas nunca conheci "aquela" mulher perfeita dos meus sonhos de menino caipira. E não assisti nas tantas décadas de vida e aquisição de saber, quase ninguém praticando o que escutava nas igrejas, nas palavras de Cristo, tão lindamente citadas pelos pastores e padres.

Só assisti a ganância, a sovina, a avareza, tomando corpo crescente nas mãos nojentas e na hipocrisia fedorenta dos semelhantes coronéis, já então urbanizados. Os mesmos coronéis que logravam o peão no sertão, hoje logram os meninos, as meninas, os adolescentes, os adultos e os velhos incautos, fazendo-os eternos escravos já embranquecidos e de corações até já rotos pela esperança corroída nos desgostos da descrença.

Esses coronéis oligárquicos e seus capatazes, defendendo o liberalismo escravizador é que relutam, negando-se a partilhar do serão nos engenhos para cevar a mandioca e transformar a raiz na farinha, para correr de mão em mão. Sempre lembro quando ouvi pela primeira vez a música CIO DA TERRA e pensei que essa música até mudaria a humanidade. Mas os fétidos corações capitalistas não conhecem a poesia do viver. Nem nunca conhecerão. Eles dominaram o sertão e dominam a cidade grande. E dominam as casas legislativas, como dominam a esperança coletiva dos caipiras já também urbanizados.

Eacoelho
Enviado por Eacoelho em 03/08/2013
Reeditado em 08/05/2024
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