Ruy Castro na Flip...

Após, uma confusão generalizada com a fila que encaminharia todos os ouvintes para o auditório na Casa de Cultura de Paraty, consegui um bom lugar para ver e ouvir Ruy Castro. O escritor esbanjou bom humor ao revelar para todos os presentes o motivo de não fazer biografia de personalidades vivas ao lembrar do

livro recolhido das livrarias feito pelo cantor Roberto Carlos do escritor Paulo César de Araújo: “Roberto Carlos em Detalhes”. Ruy conta que fez a opção de escrever a biografia sobre os mortos: "Porque os vivos são pouco confiáveis".

Ruy ficou conhecido e reconhecido por ter entre os seus biografados Nelson Rodrigues, Mané Garrincha, Carmem Miranda. O autor mostrou uma das suas regras para escrever uma biografia, que é a esperar ao menos oito anos para começar a escrever para haver um distanciamento entre biógrafo e biografado: "E o biógrafo não pode deixar que suas emoções e convicções interfiram no trabalho. Ele não pode aparecer, não tem direito de imaginar, nem intuir nada. Está ali para recolher informações e conversar várias vezes com o mesmo entrevistado.”

E foi mais além, ao afirmar com convicção:

“O biógrafo deixa de existir como pessoa. Ele se muda para a vida do biografado e a busca pelos mínimos detalhes se torna uma coisa doentia."

O biógrafo-escritor emocionou a todos os presentes ao contar da sua fase critica no alcoolismo em que chegava a beber no mínimo dois litros de vodca por dia, Ruy leu à platéia uma coluna publicada na Folha de S.Paulo sobre os 25 anos em que está abstêmio. Cinco anos passou e Ruy resolveu escrever sobre um alcoólatra. Tinha certeza que sua experiência no assunto o ajudaria a fazer as perguntas certas para o trabalho.

“Imediatamente me veio à cabeça o Garrincha. Eu não queria contar a história de um derrotado. Queria contar a história de um vencedor! Não era por falta de amor que o Garrincha bebia. Ele foi amado desesperadamente por Elza Soares e pelo povo brasileiro. Foi um vencedor destroçado pela bebida.”

Eu senti uma emoção em dose dupla ao ouvir os detalhes sobre os fatos da sua doença (grave) junto a sua biografada, a nossa “Pequena Notável” a eterna Carmem Miranda.

Ruy Castro estava sentado escrevendo sobre a Pequena Notável, quando percebeu uma irritação na garganta, incomodado marcou a sua ida ao médico e a assustadora constatação de um tumor maligno. Não parou de escrever a obra entre sessões de quimioterapia e radioterapia. “A Carmem Miranda me ajudou a escrever. Eu não pensava na dor, em nada, pensava só nela. É claro que os médicos foram importantíssimos, mas se não fosse a Carmem para me levar adiante...”

Fã assumido de empadinhas, ele pode perceber a sua melhora ao sentar em uma mesa no “Caranguejo”(um boteco do Rio de Janeiro), frente a frente com um prato de empadinhas, para testar se conseguiria comê-las, o salgado é famoso pelos freqüentadores do bar pelo seu recheio e massa esfarelenta.

Ruy explicou que, uma operação na garganta pode afetar a salivação e obrigar a pessoa, a dar adeus a comidas muito secas, como farinha, farofa, empadinhas. Em raros casos, se as glândulas não tiverem sido atingidas drasticamente, poderá acontecer uma pequena recuperação da lubrificação, que ainda pode ser estimulada com limonada ou outros líquidos que a façam salivar.

“A primeira empadinha foi atacada com cautela, tendo ao lado um copo d'água, por via das dúvidas. O naco comportou-se bem e desceu com suavidade pela epiglote. Mandei o segundo -idem. Agora, o teste definitivo: o naco final. Gulp. Lá se foi ele, sem problemas. Eu estava salvo. Atirei-me às outras. Tudo isso foi em fins de 2005 e, desde então, quase mil empadinhas já foram engolidas com amor.”

Questionado por alguém da platéia sobre ir ao Maracanã reformado para a copa do mundo, ainda soltou este palpite: “Agora torcedor não pode mais tomar chuva. Futebol não é ópera. Não tem batucada, não tem charanga. O torcedor virou um inglês, um suíço.”.