COLEGA DE TRABALHO - IV
E mais um dia chegou e, como um sol vivo iluminando a minha existência, ela acaba de entrar. Hoje não ouvi o bom-dia quase sem som, mas a vi falando com colegas enquanto eu a olhava através das margens do monitor. Acabou de passar rente a mim e foi sentar-se à mesa próxima da janela. O perfume ainda está no ar, veio do corpo dela — um presente invisível que tento segurar. Perto da janela e muito longe de minhas intenções está o invólucro de suavidade e beleza. Ainda não sei como será o meu dia, mas com certeza a presença dela irá me deixar suspenso no ar o tempo todo. Não consigo imaginar este lugar sem ela. Se algum dia for demitida eu deixarei de trabalhar... O período da manhã evaporou-se como uma pequena umidade sobre a chapa quente, e a tarde está deslizando-se enquanto meu coração começa a fechar-se para o mundo e para mim. E esse tempo que sempre coloca um fim em todas as coisas faz parar o expediente e cria condições para que a porta da noite fique escancarada para ela. Todos estão se movimentando para sair. Hoje não fiquei por último. Estou a três passos dela e volto a sentir o perfume. Os cabelos, cor de cobre, escorregadios sobre os ombros destacam a cintura fina logo abaixo e o começo de uma colina delicada e amável. O anjo que será acolhido pelos braços do crepúsculo agora segue pela calçada da rua movimentada enquanto vou para minha morada solitária. Onde será que ela dorme? Anjo dorme? Amanhã, desde muito cedo, será esperada com ternura.
(Jorge Lemos)
(Jorge Lemos)