COLEGA DE TRABALHO - III 

                        Hoje ela foi a última a entrar, pensei que não viria, mas compareceu. Manchas azuladas circundam-lhe os olhos. Sinto logo que o seu olhar continua seguindo a trilha que a leva rumo às sombras da noite. Não sei exatamente o que acontece, mas meu corpo arde só de pensar o que ela pode estar fazendo longe de mim. Com muita atenção, como ontem, pude ouvir um bom-dia quase inaudível e sem rumo certo sair dos lábios pelos quais passei a sofrer. Apesar de tudo, com ela por perto há sempre uma luz que se emana das pessoas e objetos. Mesmo com a indiferença e o gelo ártico, quero vê-la, tê-la... E assim, olhando-a e seguindo-lhe os movimentos, com razoável discrição, mais uma vez meu dia começou e continuou iluminado, porém, tenso... Mas, como tudo que é bom galopa no tempo, a tarde começou a chegar e ela volta a ficar agitada e demonstra que já está se preparando para se ocultar... longe de mim. Percebo isso no seu jeito especial: um ar daquele que não enxerga mais ninguém. Estou enxergando e sentindo o fim do dia engolir os últimos momentos. Vejo agora o corpo amável levantar-se e se misturar aos colegas. Está saindo sem se despedir. Fiquei por último, e na minha frente desço os degraus da escada que ela deverá subir amanhã cedo. Será? (Jorge Lemos)
Silva Lemos
Enviado por Silva Lemos em 29/07/2013
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