Uma visita ilustre

Recebi hoje, pela manhã, uma visita ilustre. Ouvi alguns ruídos estranhos pela casa que não identifiquei o que era. A casa dormira com portas e janelas fechadas com todo o silêncio peculiar daquela noite.

Preparava um pequeno lanche enquanto pensava no roteiro dos afazeres do dia, pois iria trabalhar após o almoço e o tempo corre depressa. Após o lanche, ao caminhar da cozinha para o meu quarto, ouvi um forte sibilar que vinha da cozinha. Um piado agudo e forte como se pedisse ajuda, mas não um chamado de desespero. Ao chegar na cozinha, procurei a fonte daquele som sem sucesso.

O som, por ser agudo, me causa dificuldades na localização de sua origem. Além do que o silêncio da cozinha retornava a imperar. Ouvia-se apenas a revoada de pardais, do lado de fora da casa, entre as bananeiras e os pés de graviola, no vai-e-vem até as brechas do telhado que dão na cumeeira onde costumam fazer seus ninhos. Ainda bem que a casa é de laje e, apesar disso, a origem desse som, essa sim, era bem definida.

Fui, então, ao outro quarto que dá para o lado da cozinha, iluminado pelos raios de sol através da cortina vermelha rendada, e nada do som. Voltei à cozinha, abri o basculante da janela de vidro e olhei para fora. De repente, aquele som diferenciado poderia vir, também, lá de fora como os outros ruídos, só que mais próximo da janela. Mas, nada do som. Desisti e caminhei de volta pra meu quarto, pois tinha que preparar umas peças de roupa para ir para o trabalho.

No entanto, antes de adentrar ao quarto, novamente aquele som piado tomou o ambiente da cozinha. Virei rapidamente e, dessa vez, vi aquela pequena criatura. Lá estava ela na beirada da forma de bolo sobre o fogão. Então, me aproximei lentamente e seu piado continuava, agora nítido e belo.

Era um beija-flor filhote de um porte majestoso e um bico que parecia mais cumprido que seu corpo.

Fui chegando mais perto, mais perto, e não acreditava no que acontecia. Pensei que aquele beija-florzinho estava cego, pois me deixou chegar bem pertinho e seu piado continuava como seus primeiros cantos. Vi que seus olhos brilhavam e me viam. Confesso que me deu vontade de pegar, não para prendê-lo. Mas, para acariciar aquela penugem ainda disforme e arrepiada cujas cores entrelaçavam-se cinza claro e verde-azul florescente.

Aí, ele levantou vôo. Deu uma guinada e saiu pelo basculante da janela da cozinha, num mergulho por entre os galhos do pé de graviola, e seu piado se desfez em meio ao frenético som dos pardais. Essa bela criaturinha havia me esperado como se me quisesse dizer: hoje cumpri meu dever, o de mostrar como ainda é bela essa nossa natureza tão carente de cuidados.