O POMAR
Por Carlos Sena

 
Tem paladar para tudo. Ou tem gosto pra tudo? Acho que tem gosto e paladar para tudo, não necessariamente nessa ordem, até porque, a rigor os dois parecem ser sinônimos, mas há um liame entre ambos. Algo como sendo o paladar mais genérico e o gosto mais particular. Independente de preferencia, acho impressionante o gosto de cada fruta e sua significação para cada pessoa. Das frutas que me são mais íntimas, destaco a banana, o caju, o abacate, o abacaxi, a manga, a goiaba.  As uvas também, mas em menor intensidade. No meu imaginário cada uma dessa vai além do gosto – mexem com o paladar e com a imaginação. Começando pelo caju, seu diferencial é a safra. Caju, diferente de “chuchu” que dá o ano todo, só dá naquela época que a gente chama se safra, salvo melhor juízo entre dezembro, janeiro e fevereiro.  O caju é uma fruta meio abusada. Adora compor: compor com uma cachaça, com o açúcar na forma de doce e compor com a água em forma de suco ou refresco. Sozinho, o caju se sente abandonado e, no máximo vira passa para ser vendido principalmente aos turistas, nãos mercados de Fortaleza e no caminho da ilha de Itamaracá. As mulheres debocham dele: “homem é feito caju que por mais que seja doce, tem um ranço”... Curiosidade histórica: dizem que os índios juntavam castanhas de caju para marcar os anos. Cada ano uma castanha e, assim, eles saberiam quantos anos havia se passado.
O ABACATE.
Ah, o abacate. Vestido naquela “farda” pensa que é militar, mas, leva consigo no “bucho” um filho que mais parece uma bola. É pobre de beleza estética – nem se compara, por exemplo, com a manga. Além do mais é amargo. Ele sozinho fica com depressão, pois só consegue ser aplaudido junto com o açúcar ou com o leite ou com outros ingredientes. Para ser metido a militar é fraquinho de consistência. Não aguenta muito e logo fica escuro e logo muda o gosto. Mas é amigo nosso dos melhores no combate ao colesterol ruim. Dificilmente se conquistaria uma mulher lhe dando um pacote de abacate. O mesmo não se pode dizer de um cacho de uva!
O ABACAXI.
Tem plateia garantida. Dizem que dele nada se perde: da casca de faz gengibirra, do miolo se faz doce e se come (ou chupa?). O danado do abacaxi não reclama de nada, nem mesmo quando se bota ele no fogo, na churrasqueira pra servir com feijoada ou com churrasco. Descascar? – Eis o seu dilema. Já virou até bordão de coisa ruim, pois quando alguém se refere a uma atividade ruim diz logo: “isso é um verdadeiro abacaxi”. Porque descascar o bicho é ruim mesmo e, dificilmente, a gente não fica com espinhos nos dedos e nas mãos. Dizer que uma mulher é um “abacaxi” é dizer ser ela um horror, um bofe. Mas o bichinho é bom de feição. Uma mesa que tenha uma fruteira e não tem um abacaxi de frente perde um pouco do seu glamour. Só não sei mesmo pra que lhe serve o rabo. Sim, aquela parte espinhosa que todos detestam. Diferente dos humanos, o rabo do abacaxi não serve pra nada, ou serve? Talvez seja a muda para nova fruta? Certo dia, pegando um ônibus no Rio de Janeiro, um vendedor de picolé greiava com o povo: quando passava uma mulher bonita ele gritava “oi uva”, quando uma feia “oi abacaxi”... Além dessas proezas e das sutilezas o abacaxi tem também o talo. Por isso acho mesmo que o cabra nasceu macho, com talo e tudo. Há quem tire o talo dele e sirva as rodelas sem ele, mas há quem não. Particularmente eu gosto dele com talo e tudo, menos com o “rabo”. Aquele rabo é o seu desencanto, mas me agrada muito seus “redondos” com ou sem furinhos no meio. Dificilmente ele não agrada a todos, a despeito de que se lhe atribuem fatores alérgicos e erupções na boca, mas não acho isso. Prefiro ele alí, “em pessoa” para eu comer ou chupar? Se for pra comer eu como e se for pra chupar eu chupo, pronto, sem briga.
A MANGA.
Eu adoro. Já começo com a terrível dúvida: chupar ou comer manga. Sim, porque lá no meu interior quando a fome apertava a gente comia a bicha de vez. “De vez” é quando ela está inchada, perto de madurar. Depois, já com ela madurinha, a gente chupava. Mas ela é meio que metida á nobre. Como se não bastasse tem um cheiro que dificilmente a gente lhe esconde sem que ninguém descubra. É uma fruta plural em seus tipos. Até manga Rosa tem. Tem manguito, manga Espada, manga Maranhão, manga Tomy, etc. Essa bichinha é tão metida a besta que a manga rosa tem uma pele que nem toda mulher tem – rosada, sedosa, cheirosa. Não teria sido essas insinuações que lhe deram o nome de rosa? Ou por conta do perfume da Rosa. Acho que tudo junto. Mas o bom mesmo é chupá-la. In loco, ou com uma faquinha amolada lascando ela por dentro e sentindo que ela acha é bom. Quando ela tá madura demais, o bom mesmo é a gente meter a cara dentro dela e chupar sem pena. Até o caroço aparecer intrometido como que a nos dizer: “pare que eu sou macho”. Acho que da manga nem o caroço se perde, pois serve pra sua reprodução, mas tudo serve inclusive a casca para derrubar gente que pisa nelas quando são jogadas nas calçadas. No carnaval de recife há uma paródia muito conhecida que se canta nas troças: “você pensa que mulher é manga, mulher não é manga não, manga pra chupar descasca, mulher não se descasca não”... Mas as próprias mulheres cantam e gostam. Dizem da manga, que os americanos adoram o seu suco e que é o mais preferido deles. Pode ser, mas prefiro de cajá. Manga é uma coisa tão boa que tem gente que chupa, que come e que manga. Mangar – um verbo bem nordestino que significa debochar de alguém, zombar de alguém  ou coisa parecida.
A GOIABA
É meio fresca mesma. Dentro dela tem uma ruma de caroços juntinhos, encostadinhos uns nos outros – uma verdadeira suruba caroçal. Tem um cheirinho de sexo para alguns. Se fosse mulher era aquela tipo facinha. Se entrega toda e há quem lhe coma com casca e tudo. A bichinha é tão puta que dá até ao bicho. Nós,  humanos quando vamos lhe comer sempre temos cuidado porque pode ter lá  dentro um bicho esperando por nós. Há goiaba vermelha e há aquela branca. Dizem que os bichos gostam mais dela branca, pois o vermelho dá um freada neles. Mas nós, humanos, lhe comemos em “AM ou FM”. O formato da goiaba é meio libidinoso, pois o seu “olho” tem significação de “fiofó”. Lá no meu nordeste se manda “tomar no olho da goiaba” querendo insinuar tomar noutro canto. Já se fala em “mulheres goiaba”. Quem seriam? Segundo dizem seriam aquelas mulheres que não se incomodam de “dar” à bicha. Eu explico: tem mulheres que adoram fazer sexo com gays – alegam que são mais carinhosos, que dão conta do recado, etc. Logo, essas seriam as que dão às bichas e, portanto, mulheres GOIABA, porque goiaba dá ao bicho. Libido à parte, gosto muito da goiaba feita doce. É uma fruta de fraca consistência, embora seu cheiro também não lhe permite ser escondida sem que logo alguém perceba.
A BANANA.
Como se esquecer dela? Banana é tudo de bom no reino das frutas. Sua praticidade ganha de todas, pois é a única fruta que já nasce em “caixinha”. Já cresce prontinha e sai do cacho para nossa boca. Não se precisa lavar uma banana para comer, pois ela está protegida na casca e isso é o máximo. Isso faz dela singular, bem como singular é sabê-la extremamente social. Vejam se se vende banana fora do cacho. Geralmente ela vem juntinha com suas irmãs, diferente de nós humanos que muitas vezes nem ligamos pros nossos irmãos. Por isso e por muito mais é minha fruta preferida. Até sua casca serve pra fazer farinha e outras guloseimas. Uma torta de banana é tudo de bom, bem como seu doce. A bicha não é muito amiga dos diabéticos, pois seu alto teor de açúcar é impeditivo, mas já  que sou “cu doce”, como. Como banana independente da minha glicose está alta ou baixa. Lasco-me todinho feito maxixe – de quatro, mas como. Sua história na vida de muitos nordestinos é intensa. Os pobres como eu e tantos sempre levavam banana para lanchar na escola. Ou pra merendar, em louvor aos cearenses. Não bastasse tantos méritos, ainda é fálica. As mulheres adoram banana. Os homens a adoram por vários motivos, e por motivos óbvios a conduzem chocando os ovos no ninho da imaginação. Macaco adora. E? Por que será que macaco adora banana? Será por conta daquela história meio confusa de que nós viemos do macaco? Gostei não. Porque tenho que admitir que os orangotangos tem bom gosto. Mas, isso é questão de somenos importância. Porque a banana dá show quando bem posta na fruteira em cima da mesa. Quando bem posta em cima da geladeira. Quando bem posta na cama...
A UVA.
Tem vocação de sapatão, pois só andam de cacho. Mas não é das minhas a preferida. No meu nordeste uva e maçã ficam nas arquibancadas para a maioria. No camarote ficam mesmo a manga, a banana, o abacaxi, o caju, o abacate, a goiaba... As demais frutas ficam por ali, com olhar de soslaio como que a pedir espaço para imperar...