Três paixões
O filósofo e matemático inglês Bertrand Russell, uma das figuras mais conhecidas e influentes do Século XX, relata com profunda sensibilidade as três paixões de sua vida. Para admirar e refletir.
"Três paixões, simples mas irresistivelmente fortes, governam minha vida: o desejo imenso de amar, a procura do conhecimento e a insuportável compaixão pelo sofrimento da humanidade. Essas paixões, como os fortes ventos, levaram-me de um lado para outro, em caminho caprichoso, para além de um profundo oceano de angústias, chegando à beira do verdadeiro desespero.
Primeiro busquei o amor, que traz o êxtase - êxtase tão grande que sacrifica o resto de meus dias por umas poucas horas desta alegria. Procurei-o também porque abranda a solidão - aquela terrível solidão que a consciência horrorizada observa, da margem do mundo, o insondável e frio abismo sem vida. Procurei-o finalmente, porque na união do amor vi, em mística miniatura, a visão prefigurada do paraíso que santos e poetas imaginaram. Isso foi o que procurei e, embora pudesse parecer bom demais para a vida humana, foi o que afinal consegui.
Com igual paixão, busquei o conhecimento. Desejei compreender os corações dos homens. Desejei saber porque as estrelas brilham. E tentei aprender a força pitagórica pela qual o número se mantém acima do fluxo. Um pouco disso, não muito, conquistei. Amor e conhecimento. Até onde foram possíveis, me conduziram aos caminhos do paraíso.
Mas a compaixão sempre me trouxe de volta à terra. Ecos de gritos de dor reverberam em meu coração. Crianças famintas, vítimas torturadas por opressores, velhos desprotegidos - odiosa carga para seus filhos - e o mundo inteiro de solidão, pobreza e dor, tranformaram em arremedo o que a vida humana poderia ser. Anseio ardentemente aliviar o mal, mas não posso, e também sofro.
Isso foi minha vida. Achei-a digna de ser vivida e vivê-la-ia de novo com a maior alegria se tal oportunidade me fosse oferecida."