Oh! Como tenho inveja!

     Continuo na agradável companhia de Mario Quintana. Estou terminando de ler Da preguiça como método de trabalho, depois de reler, dele, Velório sem defunto, Porta giratória e Preparativos de viagem.
     Não nego: Oh! como tenho inveja! Inveja de quê? De dizer, como o Quintana, coisas assim, na simplicidade de sua prosa, irônica e profunda:     
     Eternidade - "A eternidade é um relógio sem ponteiros."
     O cão - "Amigo e grande puxa-saco do homem." 
     Horas - "Nunca perguntes que horas são na presença de um defunto." 
     Covardia - "É uma covardia falar mal dos inimigos; só se deve falar mal dos amigos." 
     A lua - "Que haverá com a lua - sempre que a gente a olha - é com o súbito espanto da primeira vez." 
     Estrelas - "No campo as estrelas brilham. Na cidade, as estrelas ardem." 
     Modéstia - "A modéstia é a vaidade escondica atrás da porta."
     Passado - "O passado não reconhece o seu lugar: está sempre presente." 
     Tic-tac - "Esse tic-tax dos relógios é a máquina de costura do Tempo a fabricar mortalhas." 
     Para Catulo da Paixão Cearense, esse Epitáfio - " Catulo não morreu: luarizou-se."
     Poetas - "Eis que, tendo Deus descansado no sétimo dia, os poetas continuaram a obra da Criação." 
     Luar - "O luar é a luz do sol que está sonhado..."

     Ah, são centenas e centenas frases desse iluminado e singular vate gaúcho nascido na cidade de Alegrete e que, no próximo dia 30 de julho, se estivesse vivo completaria 97 anos.
     Minha homenagem. Faço-o, transcrevendo este seu pensamento sobre o poeta e o poema que encontrei nas páginas de Da preguiça como método de trabalho.
     " 
O apanhador de poemas - Um poema sempre me pareceu algo assim como um pássaro engaiolado... E que, para apanhá-lo vivo, era preciso um cuidado infinito.
     Um poema não se pega a tiro. Nem a laço. Nem a grito. Não, o grito é o que mais o espanta. Um poema,  é preciso  esperá-lo com paciência e silenciosamente como um gato.
     É preciso que lhe armemos ciladas: com rimas, que são o seu alpiste; há poemas que só se deixam apanhar com isso. Outros que só ficam presos atrás das catorze grades de um soneto. É preciso esperá-lo com assonâncias  e aliterações, para que ele cante. 
     É preciso recebê-lo com ritmo, para que ele come a dançar. E há os poemas livres, imprevisíveis. Para esses é preciso inventar, na hora, armadilhas imprevistas

     Nesse pequeno texto se detecta, com facilidade, o lirismo que revestia a poesia e a prosa de Mario de Miranda Quintana, "considerado o poeta das coisas simples", morto em 5 de maio de 1994, em Porto Alegre. 

     Atenção, senhores fazedores de "versos": esvrever poemas, poemas de verdade, nõa é coisa fácil.

     

      
       
Felipe Jucá
Enviado por Felipe Jucá em 20/07/2013
Reeditado em 13/09/2013
Código do texto: T4396425
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