Caía a noite desta sexta-feira, 19. Os instantes que antecediam a passagem de uma dita “manifestação” me deixavam apreensivo. Percebi a movimentação estranha de policiais, fortemente armados. Falavam com sotaque diferente. Talvez fossem integrantes da Força Nacional. Planejavam o melhor posicionamento para a “guerra” que se aproximava. Eu ouvia tudo, bem aproximado deles. Algum senso de preservação me aconselhava a correr para o interior da loja. Outra voz interior, mais forte, obrigava-me a ficar, e proteger a fachada. Permaneci, ali, parado, braços cruzados, na linha de tiro.
Eu fitava a matilha de bichos encapuzados, que se aproximava rapidamente. O primeiro virou-se, em minha direção, gritou palavras de ódio, de raiva, e arremessou a primeira pedra.
Foram várias e várias. Elas se estatelavam nos tapumes do prédio vizinho, o verdadeiro alvo. Eram pedregulhos, pedaços de louça, tijolos, que voavam, e caíam bem ali, ao meu lado. Não mexi um músculo, não me desviei, apenas fitei a matilha.
Naquele instante, minhas mãos estavam frias, meus olhos atentos. Eu me envergonhava de minha espécie humana. Ao mesmo tempo, absorvia uma parte daquela ira, contaminava-me. E continuava olhando para cada um dos arremessadores. Talvez com o mesmo instinto animal, imbecilizado da mesma forma, eu planejasse o revide contra a exata pessoa (dentre os tantos) que me atacasse.
Arrepiei-me, estufei o peito, e esperei que meu estopim fosse detonado. Eu chorava e sentia com tanta intensidade minha revolta que já me tornara um novo cão, pronto para a mesma luta violenta que abominava. Esperava apenas pela centelha.
Eles jogaram dezenas de pedras. Todas chegavam bem perto de mim.
Desceram para o meu lado da rua, rasgaram os sacos do lixo que eu acabara de acondicionar na calçada. Pegaram mais pedras no chão.
Meus olhos varriam as movimentações dos fantoches da violência, em seus saltinhos, no posicionar de suas mãos, no direcionamento dos arremessos. Repetia para mim mesmo: “covardes, por trás de suas máscaras!”
Atrás de mim, estava uma porta de vidro, ainda intacta. Lá dentro da livraria, transeuntes já se teriam escondido, em pânico. Minha cólera era cega para alguns detalhes. Eu não via tudo que me acontecia. Somente mirava e encarava os combatentes. Como mais um idiota, tocado pelos mesmos rompantes de miséria humana, estava pronto para correr, alcançar, contra-atacar, com exatidão.
Mas, tão rápido como se iniciaram, os ataques escasseavam. Os mascarados já se deslocavam, distanciando-se, carregados de pedras, paus, e muito ódio.
Eu ainda tremia, suava frio, quando finalmente decidi arredar o pé da calçada. Fui ao meio da rua, recolhi o lixo espalhado pelos “manifestantes”.
Mas, não consegui ficar calado. Falei ao primeiro grupo de retardatários (não encapuzados): “Por que rasgar os sacos e jogar o lixo na rua? É esse o sentido de cidadania que vocês conhecem?” Para meu espanto, as ovelhas acompanhantes responderam: “É para dar uma lição na Prefeitura ... É isso aí!”
Meu choro que, um pouco antes, estava pronto, agora vacilava. Seria uma lágrima mal escorrida a lembrança desta noite. Como uma marca de sangue no canto do olho.
Eu fitava a matilha de bichos encapuzados, que se aproximava rapidamente. O primeiro virou-se, em minha direção, gritou palavras de ódio, de raiva, e arremessou a primeira pedra.
Foram várias e várias. Elas se estatelavam nos tapumes do prédio vizinho, o verdadeiro alvo. Eram pedregulhos, pedaços de louça, tijolos, que voavam, e caíam bem ali, ao meu lado. Não mexi um músculo, não me desviei, apenas fitei a matilha.
Naquele instante, minhas mãos estavam frias, meus olhos atentos. Eu me envergonhava de minha espécie humana. Ao mesmo tempo, absorvia uma parte daquela ira, contaminava-me. E continuava olhando para cada um dos arremessadores. Talvez com o mesmo instinto animal, imbecilizado da mesma forma, eu planejasse o revide contra a exata pessoa (dentre os tantos) que me atacasse.
Arrepiei-me, estufei o peito, e esperei que meu estopim fosse detonado. Eu chorava e sentia com tanta intensidade minha revolta que já me tornara um novo cão, pronto para a mesma luta violenta que abominava. Esperava apenas pela centelha.
Eles jogaram dezenas de pedras. Todas chegavam bem perto de mim.
Desceram para o meu lado da rua, rasgaram os sacos do lixo que eu acabara de acondicionar na calçada. Pegaram mais pedras no chão.
Meus olhos varriam as movimentações dos fantoches da violência, em seus saltinhos, no posicionar de suas mãos, no direcionamento dos arremessos. Repetia para mim mesmo: “covardes, por trás de suas máscaras!”
Atrás de mim, estava uma porta de vidro, ainda intacta. Lá dentro da livraria, transeuntes já se teriam escondido, em pânico. Minha cólera era cega para alguns detalhes. Eu não via tudo que me acontecia. Somente mirava e encarava os combatentes. Como mais um idiota, tocado pelos mesmos rompantes de miséria humana, estava pronto para correr, alcançar, contra-atacar, com exatidão.
Mas, tão rápido como se iniciaram, os ataques escasseavam. Os mascarados já se deslocavam, distanciando-se, carregados de pedras, paus, e muito ódio.
Eu ainda tremia, suava frio, quando finalmente decidi arredar o pé da calçada. Fui ao meio da rua, recolhi o lixo espalhado pelos “manifestantes”.
Mas, não consegui ficar calado. Falei ao primeiro grupo de retardatários (não encapuzados): “Por que rasgar os sacos e jogar o lixo na rua? É esse o sentido de cidadania que vocês conhecem?” Para meu espanto, as ovelhas acompanhantes responderam: “É para dar uma lição na Prefeitura ... É isso aí!”
Meu choro que, um pouco antes, estava pronto, agora vacilava. Seria uma lágrima mal escorrida a lembrança desta noite. Como uma marca de sangue no canto do olho.