Reinações do 9 de Julho

As más línguas irão dizer que vim para o estado de São Paulo apenas para ter outro feriado. De fato, esta é a primeira vez que comemoro o 9 de Julho. Comemorar, naturalmente, é maneira de dizer, pois, além de não entender exatamente o que se comemora, eu estou de férias e de qualquer jeito não iria trabalhar. Até então, eu tinha para mim apenas que o 9 de julho foi o dia em que se relatou pela primeira vez o uso do guardanapo (é verdade). Mas sinto-me aliviado ao descobrir que o próprio Mário de Andrade, para quem até as nuvens eram paulistas (essa maldade é do Braga), confessou que muitos dos que participavam ou defendiam a Revolução Constitucionalista em 1932 não sabiam o que era Constituição.

Sei mais ou menos o que é uma Constituição, mas já não consigo entender muito bem as motivações de cada lado àquela época. Ainda estou em Taubaté, e por aqui a Revolução de 1932 também teve os seus reflexos. Foram 6 os homens da cidade que tombaram na batalha. Quem estava à frente das ações em Taubaté eram figuras públicas ligadas ao governo ou à elite local. Há quem diga que a população da cidade nem ligou para a Revolução, pois não houve registro de manifestações populares lamentando a derrota. Não posso confirmar. Mas presumo que, em nossos tempos, também grande parte da cidade não esteja ligando para a Revolução, preferindo passar o dia de forma menos cívica. Em todo caso, a data continua bem lembrada como nome de uma de suas principais avenidas, e sendo inclusive repetida em uma pacata rua do distrito de Quiririm, no interior do município.

Taubaté, vocês sabem, é a terra do Monteiro Lobato, que naqueles acontecimentos de 1932 defendeu a separação de São Paulo do resto do Brasil – Lobato via apenas dois caminhos para o estado: a hegemonia nacional ou a separação. Bem se vê que aconteceu o primeiro. Mas Taubaté também é a terra do Mazzaropi, e sobre esse não se sabe que tenha algum dia dado uma opinião sobre a Revolução de 1932 que tenha sido levada em conta. Ele mesmo dizia que o seu sucesso se explicava por falar a língua do povo. Mas naquele ano de revolta, Mazzaropi era apenas um rapazote que trabalhava como pintor de cenários e ator de peças que distraiam os homens que faziam a guerra.

Aproveitamos o dia para visitar o seu museu, tão escondido que a própria atendente se espanta que tenha sido encontrado. Ela também pergunta se nós chegamos a fazer figuração em algum filme do Mazzaropi. Mas nós somos caipiras de verdade, e não figurantes. E passamos a caminhar em meio aos cartazes e as histórias de todos os filmes do Mazzaropi, que saiam praticamente todo ano, cada um feito com a renda do anterior, e com incríveis superações diante das limitações da época – algo típico dos gênios apaixonados. Leio as sinopses e me simpatizo com as discussões provocadas. Penso nos filmes de Hollywood, e penso especialmente naquilo que não se pensa.

Saímos de lá e vamos para São José dos Campos. O feriado está em toda parte. Esqueço o Mazzaropi, esqueço a guerra de 1932. Temos o nosso próprio jeito de fazer filme, e temos as guerras do nosso tempo. Da sala de cinema, vejo o mundo se transformar em zumbis na A Guerra Mundial Z.

Henrique Fendrich
Enviado por Henrique Fendrich em 19/07/2013
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