Grandes Sertões: São Paulo

“Só se vê prédio e casa. De natureza mesmo, só as nuvens. E aquelas montanhazinhas”. Assim observou a bonita moça sentada à minha frente enquanto nos preparávamos para pousar em São Paulo. Sem dúvida ela achou que seria uma condescendência muito grande incluir o Tietê, também visível ali de cima, entre as obras da natureza na capital paulista. Cheguei até mesmo a ouvir uma conversa questionando se era realmente água aquilo que víamos lá embaixo. A moça bonita reparou ainda na poluição do ar. Fez questão de mostrar a névoa escura para sua amiga. Esta, apenas respondeu: “Tenso, véi!”.

E assim fui chegando a São Paulo, pela segunda vez na vida – estou desconsiderando as conexões de vôos. Há oito anos eu cheguei a São Paulo de ônibus. Já escrevi sobre isso: andei de metrô, caminhei pela Paulista, cruzei a Ipiranga com a São João, vi o Canindé, o antigo Carandiru e preenchi o bilhete de passagem para um velhinho no Tietê – o Terminal, e não o Rio. E era justamente para o Terminal Rodoviário do Tietê que eu iria agora.

Lá eu pegaria um ônibus que me levaria a Taubaté, no Vale do Paraíba. Ainda impressionado por não haver uma ligação direta entre Congonhas e o Tietê, busco um ponto de ônibus na Avenida Washington Luís. Este ponto, imagino, é um dos primeiros contatos dos visitantes com a cidade. Procuro o ponto e não acho. Vejo pessoas paradas sem muita ordem. Não há um abrigo. Não há sequer uma placa indicando o local exato. Decido ficar por ali mesmo. A calçada é apertada. Encosto-me na parede de um comércio. Mal encosto e me pedem uma licencinha, porque estão pintando a parede. Eis a minha recepção na cidade.

Tenho anotado na cabeça o número de um ônibus que devo pegar até uma estação de metrô. O ônibus aparece. Reparo que está escrito realmente o nome de uma estação de metrô no itinerário. Embarco e relaxo. Fico na expectativa de chegar à estação. O tempo vai passando. Começo a achar muito demorado. Mas confio cegamente no itinerário e permaneço dentro. Chego em ruas estranhas. Súbito, o ônibus estaca: é o ponto final. Nem sinal do metrô. Tenho que descer. Estou perdido no meio do nada – até agora não sei onde estive. Nonada. Curiosamente, não fui o único a descobrir que pegou o ônibus errado só no ponto final. Indicam outro ponto para nós. Seguimos para lá. Pego outro ônibus, essa vez escrito bem grandão “Metrô Jabaquara”. Pergunto ao cobrador quanto tempo demora até lá. Ele responde: mais ou menos uma hora. Quase pergunto se isso é no fuso daqui ou no de lá.

Chego, finalmente. Vou comprar um bilhete para o metrô. A fila está enorme. Sou tomado por uma repentina saudade da roça. Começo a questionar a minha decisão de viajar. Murmuro palavras muito duras contra a cidade, e o que menos disse foi que era uma loucura. Compro o bilhete, entro no metrô e enfim chego ao Tietê. São quase quatro horas da tarde e eu ainda não almocei. Decido comer um prato completo, refeição de verdade. Vou a uma lanchonete, passo um tempo escolhendo, e então faço o meu pedido. O atendente explica: refeições, só a partir das cinco horas. Suspiro. E desejo ardentemente que o Vale do Paraíba ainda seja conhecido como os Sertões de Taubaté.

Henrique Fendrich
Enviado por Henrique Fendrich em 17/07/2013
Reeditado em 17/07/2013
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