EXAME PSICOTÉCNICO
Quase dois anos depois da prova e do resultado, recebi o telegrama para tomar posse do meu cargo, no concurso que fiz. Comparecendo ao departamento pessoal foi-me dado um prazo de 48 horas para providenciar determinada documentação e exames admissionais.
O prazo foi inquestionavelmente curto, mas pode ser obedecido. A documentação era simples de obter e os exames, embora feitos às pressas, também. O mais interessante entretanto foi psicotécnico.
Esse se procedeu com uma rápida entrevista, com perguntas pontuais, como por exemplo "o que você acha que é um defeito seu?". Não sei bem o que respondi. Depois das perguntas, fui para o "teste dos tracinhos".
Quando, no outro dia, peguei meu teste, fiquei satisfeito com o resultado. Entre outras características, eu possuía "estabilidade emocional e afetiva", "produtividade" e "boa desenvoltura".
Passados alguns meses do teste e da minha admissão na instituição, consegui o necessário para um novo projeto: minha primeira habilitação.
É um projeto um tanto dispendioso e tive que passar dois meses na hora extra, para juntar o capital necessário. Mas consegui. Escolhi a autoescola, marquei meu exame no Detran, fiz o exame de vista e então fui, novamente, fazer o teste psicotécnico.
Dessa vez, foi um pouco diferente. Não no exame, mas na metodologia utilizada pela profissional. Enquanto no exame admissional fui recebido com extrema simpatia, a credenciada no Detran utilizou a metodologia do terrorismo.
Agora eu sei que o teste não foi a entrevista ou o exame dos tracinhos. Somente agora sei que foi resistir à pressão psicológica. E eu escutei bastante coisa. Algumas das pérolas foram:
"Você é muito desinteressado."
"Você está muito distante."
"Se isto fosse uma entrevista de emprego você estaria fora."
"Você é muito antissocial e isso não é bom para quem quer ser motorista."
Mas a melhor de todas foi:
"Você aparenta um quadro forte de depressão. Se ainda não desenvolveu, deverá ter."
Não é um diagnóstico animador de ouvir. Depressão é um câncer. Um tumor que destrói, não o seu corpo, mas sua alma, sua mente e seu espírito. Provavelmente uma das doenças mais terríveis e perigosas que o homem pode contrair.
Depois daquilo e de toda a simpatia da doutora, perdi o meu dia. Raiva e frustração se alojaram em mim, perante a certeza do fracasso no meu projeto de habilitação. Além disso, somava-se a preocupação em estar gravemente doente.
Mas no dia seguinte acordei melhor. Dediquei um bom "foda-se" a toda aquela preocupação e segui vivendo. Depois, no outro dia, procurei meus resultados no Detran. Fora aprovado em ambos os exames.
Desde então estou assim, aliviado. Ainda reflito, contudo, no motivo de ter sido tão agredido psicologicamente. E penso, com carinho, em combater o terrorismo com uma pequena bombinha de São João dentro daquele consultório. Quando eu estiver dirigindo, claro.