4 - PEDRINHAS NO CAMINHO
Nasci num berço católico, desde bem pequeno assisti as missas, minha primeira escola aos cinco anos era franciscana e foi sob os auspícios de minha vó. Fui batizado em casa e isto bastou, até que o padre descobrisse, então com sete anos aconteceu o verdadeiro batismo. O padre me sabatinou sobre meus conhecimentos religiosos, me fez peregrinar pela igreja São Francisco, apresentou-me Jesus morto, dormindo numa redoma. A igreja é aquela na rua Domingos Crescêncio em Porto Alegre, bem de ladinho com a rua São Luiz. Enfim fomos almoçar em comemoração. A primeira comunhão deu-se dois anos depois, numa igreja simples, de madeira, todos nós linearizados por uma vestimenta branca em forma de batina. Alguns meses de catequese, no sábado anterior a confissão. Dos pecados confessados um deles rendeu algumas indagações do padre, que se escondia atrás do confessionário, embora eu o reconhecesse pela voz. Ele indagou-me se eram só aqueles e finalizou com a sentença:
- Isto não são pecados perante os olhos de Deus, mas por teres sentido raiva de tua mãe, deverás rezar tantos pais nossos, tantas avemarias e tantos isto e tantos aquilo.
No dia seguinte houve o sacramento. Depois da chacota sobre meus pecados, nunca mais fiz questão em confissão e nem de penitências, por outro lado até hoje tenho predileção em colocar uma pedrinha na entrada da toca das formigas, para vê-las amontoando-se em agonia, mas já não tenho o tempo para observa-las, embora não faça mais, se fizesse, não seria pecado, dito pelo frei franciscano.
Imagino a agonia de querer entrar em casa e ter perdido a chave, querer subir no ônibus e ele estar lotado, querer ser feliz e não poder, querer sorrir e ser desdentado, querer comer e não ter dinheiro, querer amar e não ser correspondido, querer ser promovido e não haver vagas. O não sempre será a pedrinha.
Do livro: Passagens de minha vida - 2013 - 2020