A banalização da mentira

Fico abismada com a facilidade que as pessoas têm para mentir e, ao mesmo tempo, como subestimam a nossa percepção! Quantas vezes fico pensando, enquanto ouço uma mentira: “Será que estão achando que todos acreditam nisso?”

Acho que na minha listinha de pecados a mentira nunca esteve... Talvez seja bem forte dizer isso, porque em algum momento da vida uma mentirinha necessária sempre bate a nossa porta. Mas mesmo assim, prefiro optar pela verdade e sofrer as consequências dela. Até porque, para mentir, é preciso que se tenha uma inteligência privilegiada ou, do contrário, contar com a pouca percepção das pessoas.

O escritor Affonso Romano de Sant’Anna bem espirituosamente (o “mente” foi proposital) diz em seu poema “A implosão da mentira”:

“Mentiram-me. Mentiram-me ontem

e hoje mentem novamente. Mentem

de corpo e alma, completamente.

E mentem de maneira tão pungente

Que acho que mentem sinceramente”.

Certa vez, na faculdade, uma colega de grupo de trabalho, para livrar toda a equipe de uma perda de pontos, inventou uma “desculpa” que eu chamaria de mentira para a professora, bem em minha frente. Aquilo me causou um tremendo mal-estar, pois ela havia me envolvido naquela história. Assim que a professora se retirou, comecei a falar sem parar, muito nervosa com o que ela havia acabado de fazer. Minha amiga mal podia compreender, pois para ela aquilo era tão simples... Até hoje, fala: “Não queiram ver a Déa nervosa...” E eu completo: “Não inventem mentira com o meu nome!”. Estranho é que depois desse episódio, ela ficou mais minha amiga. A nossa amizade é sólida justamente por causa disso.

Será que, atualmente, ser desmascarado por causa de uma mentira, não é mais desmoralização? Quando vejo os rumos que estão assumindo as investigações, CPIs, prefiro simplesmente me poupar de ser espectadora desses deprimentes espetáculos. É extremamente insuportável ver o poço de mentiras em que esses políticos se afundam a todo instante, as suas negações diante de evidências, de provas comprometedoras... Será que acham que somos um bando de idiotas ou pessoas sem ação? Para o bispo Dom Mauro Morelli o povo brasileiro é um povo muito bondoso, pois se não o fosse, nenhum presidente sairia vivo do palácio. Sabe que ele tem toda razão?

Há poucos dias, me causou surpresa a forma como um assaltante deu entrevista na TV de Pará de Minas. Ao contrário de quase todos os criminosos, que estamos acostumados a ver, utilizando de todo artifício possível para se ocultar das câmaras (colocam as mãos no rosto, abaixam a cabeça, encobrem-se com os cabelos, como fez Suzane Von Richthofen), ele simplesmente encarou as câmaras, os fotógrafos... Quando interrogado, não negou nada e, por incrível que pareça, foi revelando até coisas que não estavam sendo perguntadas. Falou claramente o número do artigo que ele estava cumprindo, etc. Um repórter perguntou-lhe como havia sido a sua infância, se a sua família tivera culpa... Ele disse que nunca lhe faltara nada e que era o único culpado, pois começara a se drogar aos doze anos. Outra atitude louvável, pois as pessoas têm uma grande dificuldade de assumir os seus erros e tentam sempre culpar alguém por eles. Esse jovem de apenas 23 anos demonstrou um grande caráter: assumindo para si toda a responsabilidade de suas faltas.

Ele merecia ser aplaudido de pé, pois não estamos acostumados a ver esse exemplo de dignidade, nem mesmo em lugares em que comportamentos assim deveriam imperar absolutos.

Déa Miranda
Enviado por Déa Miranda em 06/07/2013
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