Nostalgia
Eu sinto falta. Eu sinto falta daquele tempo em que não havia preocupações, em que a dor era cair enquanto corria e esfolar os joelhos. Eu sinto falta daquela cidade quente, daquela casa mais gelada, das paredes brancas, da madeira alaranjada das portas, da maçaneta cor de bronze, do mármore negro da pia, do quintal espaçoso para correr, da cadela que brincava e pulava. Sinto falta do jardim, do gramado, do pé de acerola cheio de pintas avermelhadas.
A casa era espaçosa, cabiam a felicidade, o choro, as brigas, as comemorações em família. Eu podia deitar no chão do quarto e pensar nos desenhos animados, nas brincadeiras de criança. Podia pensar no dia seguinte, no que ia brincar na escola, no que faria durante a tarde e podia dormir tranquilo sabendo que as coisas estavam nos eixos. Podia brincar com meus pais e vê-los sorrindo, ver a demonstração de amor e, acima de tudo, senti-lo.
Mas, como lei da vida, as coisas mudam de uma hora pra outra, ela -a vida- sai do eixo, a cidade se torna fria, a casa se torna insuportável, as paredes raxam, a madeira apodrece, a maçaneta da porta cai, o mármore quebra, o gramado amarela, a árvore morre. A felicidade se torna rara e dá espaço às preocupações que preenchem a casa, que me impedem de deitar no chão e pensar no outro dia de forma positiva, que me fazem arrancar os cabelos, que tiram os sorrisos, que ofuscam o amor, impedem-me de sentir.
A felicidade, agora, só pode ser adquirida em pequenas amostras, vendidas em frascos. Comercializada e totalmente artificial, tornando artificial uma família toda. Falsos sentimentos, raras conversas, constantes desentendimentos, constantes choros, constantes mudanças.
Toda uma história jogada no fundo de um poço gélido e escuro, onde ecoam os problemas e a dor, que se reproduzem incessantemente na cabeça, impedindo o tão esperado sono de chegar, impedindo que qualquer outra sensação tenha seu espaço.