O OVO

O Remelão entrou pelo corredor do cortiço resmungando.

----Que tanto você resmunga Remelão -- Perguntou Dona Sebastiana, enquanto batia a roupa no tanque encostado ao beiral da casa.

----É por causa daquele fofoqueiro do Onofre. Vive falando pra todo mundo que aqui na vila tem um monte de gente usando tênis de mil reais e que se abrir a geladeira do infeliz não tem um ovo pra comer.

Dona Sebastiana olhou por debaixo do zoio e não falou nada.

----Qualquer dia vou dar uns murros na fuça dele só pra deixar de ser intrometido! --Concluiu Remelão.

Dona Sebastiana deu-lhe as costas e continuou esfregando a roupa. O Remelão abriu a porta do seu mocó e entrou.

Voltou logo em seguida e chamou pela Dona Sebastiana.

----Fala Remelão o que você quer agora. --Perguntou Dona Sebastiana.

----A Senhora não tem um ovo pra me emprestar, depois eu devolvo?

Dona Sebastiana pegou o cigarro que estava na beirada do muro, deu uma forte tragada e enquanto soltava a fumaça pelas narinas perguntou:

----Um ovo?... Você quer um ovo?...

----É... um ovo! A semana que vem eu devolvo!

Dona Sebastiana olhou de relance para o tênis novo do Remelão e novamente espiando por debaixo do zoio respondeu:

----Você é foda viu Remelão! Vou até ficar quieta! Nem vou falar nada!