Jeito caipira

- Num ranchinho de sapê,tarimba(cama) de madeira bruta,vivia tranquilo enquanto criava seus sete filhinhos.

De madrugada quando o galo cantava, nem se incomodava,sabendo que sua Lindinha ia mesmo cuidar de tudo.

O pobre do " carijo" bem que se esforçava,cantarolando vezes seguida, em vão.

Acordar cedo , dizia ele:

-Só se for pra sobrar mais um tempinho pra ficar à toa,pois trabaiá quié bãu memo, Zequier num que não.

Lindinha é que tomava frente de tudo,mesmo grávida,ela acordava com as galinhas,trocava os panos mijado dos pequenos,ajeitava sua matula,enxada nas costas e rumo à rocinha que ela mesmo plantava.

-De lá ficava observando o comportamento do marido,dizia baixinho,um dia inda largo dele,mas o tempo ia passando...Lindinha grávida de novo...pensava no próximo rebento e por ali ficava.

De volta pra casa, inté insaiava um refrão de falatório pra dizê pro marido,mas quando chegava em casa o danado, já havia pirulitado, rua, buteco era o que ele gostava.

Nas madrugadas de frio em baixo da bicicleta, estica e puxa,os dois faziam mais um rebento.

Lindinha ,gostava também de ficar agarradinha,com seu marido,tinha por ele um sentimento estranho,não sabia explicar,mas sabia com certeza, amor, num era,garantia pra si mesma em seu dia a dia de labuta.

No domingo lá vai Lindinha,com seus filhinhos, vestidos com modéstia,assistir a missa na capela do município.

Acordava cedo pra dar tempo de banhar a prole,vestiam o que tinham,pés descalços,chapéu de palha na cabeça.

Lindinha usava um coque feito de duas tranças,preso a um grampo, no meio do coque uma flor pra enfeitar ,não só os cabelos, mas também a vida,que andava meio sem graça.

Vestido de chita , já bem surrado,olhava para os filhos e sonhava um dia sair daquela vida mardita.Viver longe dali,levando na bagagem somente a lembrança,dos tempos vividos junto ao seu marido Zequier.

Na capela pedia à Nossa Senhora pra iluminar os pensamentos,de volta pra casa, corria até a venda, ia trocar ovos em troca de pão,querozene,açúcar,sal e um naco de carne de sol.

Zequier também ia junto,mas não pra ajudar ou rezar,pra bater um papinho com os amigos,tomar uma pinguinha.

A simplicidade de Lindinha,comovia o dono da venda, que lhe servia mais que o pedido feito por ela,pensando no que as crianças pudessem se alimentar.

Voltavam felizes carregando o fardo de compras, faziam planos para um almoço mais saboroso.

Cansada daquela vida, Lindinha toma uma decisão,levanta cedinho apronta uma trouxinha com seus pertences,sai em busca de seus sonhos.

Os filhos deixa para trás,a angustia toma conta do seu peito mesmo antes de alcançar a estrada.

Pensamentos estranhos atordoam e corroem sua alma,segue em frente caminha lentamente na madrugada fria,o peito ainda conserva o alimento sagrado,seu rebento precisa dele,mas Lindinha está decidida, não vai ceder,às amarguras do pensamento.

Vou viver nova experiência,nova vida,assim que estiver melhor volto pra buscar meus filhos,dizia ela enquanto apertava o passo em direção ignorada.

Já longe, bem longe, o amor falou mais alto,assentada num tronco, começa imaginar a vida sem os seus.

Mesmo Zequier aquele mardito, preguiçoso,vai me fazer farta,dá mais alguns passos à frente,pára decidida a voltar.

Olha em volta e percebe a distância da casa, já é noite, Lindinha respira forte,ajoelha e pede mais uma vez à sua santinha.

Ilumina minha Santinha,preciso do teu socorro,não posso vortá à aquela vidinha danada,mas tomem num posso deixá meus fiínho.

Ave cheia de graça,proteja meus fiínho, faiz com que a priguiça de Zequier vai simbora, ôh home danado! Tá iguar bicho da zunha grande !

Entre uma reza e outra Lindinha adormece,assentada no tronco,do jequitibá,lá pela madrugada ,vê ali parado à sua frente. Zequier,olhando pra ela, com aquele olho de home preguiçoso,mas com um carinho que só ele sabia olhar fazer.

Uai muié ! ocê perdeu o camim de casa,dondé cê veio pará...ocê num tá pensando largá dieu não né?

Ôh Zequier meu marido, inté qui tô sim ,mas se ocê prometê larga essa priguiça,eu vorto pra casa,os meus fiínho pricisa de mim.

Os dois se abraçaram e juntos voltaram a viver, pra criar os filhos, mas a preguiça,de Zequier,sei não...

Sissapoetisa
Enviado por Sissapoetisa em 03/07/2013
Código do texto: T4370534
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