A Aparição

Às vezes o inverossímil torna-se verossímil, assim, de uma hora pra outra, basta que pisemos no chão sacrossanto de uma igreja.

Uma leve tontura aturdiu-me os pensamentos. A catedral lotada como nunca antes, como se as pessoas pressentissem que aquele dia seria especial.

Na igreja fazia muito calor, até mesmo a pintura da virgem Maria suava pelas brancas vestes.

Em meio à voz altissonante do padre e os sons melodiosos do órgão, uma figura se aproxima, indo em direção ao altar. Todos levantaram-se quando o padre levou as mãos ao céu e começou a orar. A figura veio caminhando a passos lentos e sibilantes. O capuz negro a tapar-lhe as velhas carnes. A faixa branca presa com um nó na cintura magra. Uma sacola atrelada às mãos junto de um crucifixo de madeira. À medida que Ela se aproximava do altar, o coro cantava “Senhor, Senhor, porque me abandonaste”, algumas pessoas choraram ao vê-la; não pela aparência Dela, mas sim pelo sentimento de humildade que tocou a todos; outras faziam o sinal da santíssima trindade, rezando junto ao flexório, depois uniam as mãos em sinal de fé. A aparição andava tão lentamente que parecia parar e depois retornar para sua jornada, sua Compostela.

Fiquei tão distraído com o capuz negro se movendo entre as pessoas, que só consegui ouvir a última palavra da cantoria, “Paz!”, a vogal tônica subiu tão alto, numa espiral mágica, indo desembocar na porta do céu.

Chegando ao altar, o pequeno vulto negro se arrastou pelos degraus de mármore branco, chegando até um enorme castiçal dourado repleto de velas acesas, esperanças iluminadas dentro de um mar de angústias. Ela toca no monumento de metal com dois dedos e depois os beija. Foi se recolhendo degraus abaixo, tal qual um Polvo arrastando-se no fundo do mar obscuro. Em seguida Ela se dirige até uma pequena pia de mármore. Com os cotovelos apoiados, ela observava sua imagem degradada pelo tempo implacável. Todos olhando fixamente para Ela, como se fosse um milagre, ali ! Diante de todos .O padre quase falava só. Como uma criatura que transcende tanta paz usar roupas negras?Não sei, são as miríades da vida, as verdades inquestionáveis do etéreo universo, enfim.

As pessoas sentam-se. Ela desaparece. O órgão cessou, suas últimas notas ecoaram nos céus.

Bego
Enviado por Bego em 25/06/2013
Reeditado em 06/04/2014
Código do texto: T4358080
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