Primeiro encontro
 


A moça levantou-se da mesa. Retirou a câmara digital. Fez um bom enquadramento. Tirou a foto. Retirou o cartão de memória. Conectou-o ao seu notebook. Nomeou a foto: “nosso primeiro encontro”. Acessou sua página de e-mails. Anexou. Enviou.
 
As conversas já contavam semanas. Conheceu o rapaz numa rede social. Tudo começou com um convite de amizade. Nunca o tinha visto antes. Gostou da foto e do perfil. Adicionou. O rapaz aceitou. Os primeiros diálogos começaram ali mesmo. Perguntas e Respostas. Bate-papos cada vez mais íntimos. Nos e-mails, iniciaram trocas de fotografias. Chegaram a conversar por telefone, mas a preferência era a tela do computador.
 
A moça ia se encantando cada vez mais com a beleza do rapaz. Ela, que até então, não fazia muito sucessos com homens, se gabava por conquistar um lindo. Sentiu-se nas alturas. Estava de fato amando. Só não haviam se encontrado ainda. Confidenciou às amigas o seu sentimento. Deram-lhe parabéns pela conquista do gato. Mostrou as fotos a elas, bem como trechos das conversas que eram escassas. O forte mesmo era a troca de fotos.
 
Sua colega de emprego incentivou-a a continuar o relacionamento virtual. A experiência dela nas redes sociais fora agradabilíssima. Conhecera o seu noivo num site de bate-papos. Mas, engraçado, não trocaram fotografias. Conversavam de tudo. Dedos teclando intensamente para acompanhar o raciocínio. Faziam descrições de si. A imaginação trabalhava bem. Marcaram o encontro. Foi paixão a primeira vista. A moça comentou que a colega de emprego foi corajosa. E se o rapaz não fosse bonito? A colega foi sincera: também teve medo. Porém, um homem que sabe usar tão magnamente as palavras, tem-nas como uma espécie de maquiagem natural. Ele era tão belo quanto sua poesia.
 
Sua colega de faculdade a censurou. Relacionamentos por internet são muito perigosos. Citou o caso da... que fora assassinada por um homem que conheceu no... Comentou ainda sobre as conversas. De fato, a moça e o rapaz restringiam os diálogos a descrições de cenas íntimas e desejos. As fotografias postadas eram ousadas. Mas o que mais quer uma moça que nunca namorou antes. Uma moça cuja libido estava no ápice. Ainda mais diante de um homem tão belo.
 
A moça pensou por um tempo. Mãe é mãe. Viu que a filha estava muito introspectiva. Aproximou-se. Ouviu a história. Perguntou se já se haviam encontrado. A filha bem que quis desde o início, mas o rapaz delongava esse momento. A mãe percebeu nisso algo estranho. A filha quis saber como a mãe e o pai se conheceram. Então, a imagem do saudoso marido veio à mente, com seu cheiro e calor. Conheceram-se no colégio. Não fora paixão a primeira vista. A iniciativa foi dele. Começou deixando bilhetinhos anônimos na carteira dela. A mãe-menina ficava encantada com as palavras. Depois, foram deixadas flores. Bombons. Poemas. Morangos. A mãe-menina procurou em seus colegas quem poderia ser. Até que um dia seus olhos pousaram nos olhos do pai-menino. E, pelo olhar, ela soube que era ele. Um dia, ele deixou uma carta com seu perfume. Então, aproximou-se daquele olhar e reconheceu o aroma de suas palavras. A mãe tira um papel dobrado de uma caixa de bombons e mostra à filha. Já não havia o perfume, mas a mãe sentia-o ainda assim.
 
A filha maravilhou-se com a história da mãe. Um olhar! Um cheiro! Humano!
 
A moça acessou a sua página do... teclou com o rapaz e lhe foi sincera. Ele não era do tipo romântico, achou graça. Marcaram finalmente o encontro. Ela chegou ao local com bastante antecedência. Era um bar. Queria pensar bem as palavras e preparar seu coração para conhecer de verdade aquele homem que a conquistou. Passeou seus olhos pelo ambiente. Viu num canto um casal se amando. O seu desejo. Mas algo pareceu familiar. O rapaz que beijava a garota era idêntico ao seu amado virtual. O casal se levantou e passou próximo à mesa da moça. Ela fitou o rapaz que percebeu seu vacilo. A moça não disse nada. O rapaz não disse nada. Ele segurou a mão da garota com quem estava e se foi.
 
Numa mesa ao lado, estava um homem também só. Sem pretensões e sem pensar, o olhar do homem encontrou-se com o da moça triste. Coragem. Ele se levantou da sua mesa. Aproximou-se da mesa dela. Cumprimentou. Apresentou-se. Pediu licença. Entregou-lhe um lenço perfumado para limpar as lágrimas. Sentou-se. Conversaram. Conheceram-se. Um olhar! Um cheiro! Humano.
 
A moça levantou-se da mesa. Retirou a câmara digital. Fez um bom enquadramento. Tirou a foto. Retirou o cartão de memória. Conectou-o ao seu notebook. Nomeou a foto: “nosso primeiro encontro”. Acessou sua página de e-mails. Anexou. Enviou.