RIFA-SE UM CORAÇÃO. (Quase uma crônica de amor)

Então eu seria rei. Desconfiei que tudo na minha vida mudaria quando a vi tão paciente, generosa, a colocar pellets no potinho do pequeno viveiro de periquitos australianos, a debulhar um alface inteiro e servi-lo aos multicoloridos e festeiros passarinhos. Pensei junto de um suspiro “Ah, vou ser um periquito!”. Depois não, eu iria ser rei.

Foi Nice que me apresentou à Joana, às seis da tarde de uma quinta, semana depois. Até hoje, Deus do céu, não entendo bem porque eu, e ela também, acreditamos piamente que encaixávamos sem folga e sem aperto, um no coração do outro. Liguei pra Nice: “Nice do céu, você é um anjo. Nice, você é um anjo do céu”. Nice disse que eu era bobo. Eu respondi não Nice, agora sou um rei.

Encontrava Joana todos os dias e era pouco. Saíamos às vezes – pra mim era chope e pra ela um suco. Contava sobre o meu dia e Joana falava até dos periquitos. Ela torcia pelo Vasco e eu gostava disso. Eu ria de quase tudo, Joana de quase nada.

Numa vez, Joana um pouco triste, pediu-me para olhar em seus olhos – olhos castanhos claros sobre um nariz delicado e boca gostosa – tive de jurar que ficaríamos sempre juntos. Jurei pra lá de três vezes. “Claro que sim filé, claro que sim meu dengo, claro que sim amor da minha vida – eu juro!”. Em contrapartida, propus um pacto a Joana: que nos disséssemos sempre a verdade um ao outro. “A verdade é sempre o melhor presente que podemos oferecer a quem a gente ama”. Ela, ao ouvir isso, riu quase que em segredo e disse que eu era um sabichão. Achava tão bom Joana me achar um sabichão!

Os nossos assuntos passaram a não só dias passados, mas os futuros também. Ofereci-a um sonho meu, o de conhecer Estocolmo. Ela achou que era um lugar muito frio, mas na minha companhia o sol brilharia todos os dias na Suécia. Joana, simploriamente, revelou-me que só desejava ir à praia. Há muito tempo não ia à praia. Assim eu gostava mais de Joana.

Tudo era tão bom e eu rei que num sábado de muito quente, um mau pressentimento me esfriou por dentro. Fui à casa de Joana e ninguém estava. Liguei para o celular dela e só caixa postal. Cadê Joana? Joana minha amada, minha dor, cadê você linda?

Chegou e passou a noite e Joana só era a caixa postal do celular. Lembrei-me de Nice, dela saberia o paradeiro de Joana. Nice disse incrível você não saber, Joana foi à praia. Foi com uma gente que ela disse ser os parentes. Nice percebeu que eu me afogara num mar de desapontamento, que meu moral estava abatido e estirado agonizante ao chão – metaforicamente dizendo – e, assim me disse um bocado de coisas legais, que me foram pílulas em forma de palavras e atenção que eu engolia numa talagada só.

Joana me ligou, exatamente um dia completo depois, com um argumento que nem numa eternidade poderei entender. “Não queria te chatear. Tinha de ir à praia com minha prima. Desliguei o celular pois se você dissesse que estaria chateado comigo, nem para o mar conseguiria olhar”. Talvez fosse mesmo verdade. Talvez ela não soubesse que só a queria ver feliz. Que se o caso fosse praia – para mim cem quilômetros era um passo. O que era cem quilômetros para quem quer ver o sol brilhando em Estocolmo? Talvez houvesse razão na simplicidade argumentativa de Joana, ou não. Não importava mais, eu só pensava como seria o beijo de Nice. Cristo do céu – aquele cheirinho bom – como seria beijar Nice? Esse era o meu único dilema e que o resto do mundo explodisse.

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Joel Rogerio
Enviado por Joel Rogerio em 02/04/2007
Código do texto: T435400