A morte em vida e o despropósito

A morte em vida e o despropósito

A existência procura através da renovação se manter em constante movimento. É preciso entender que não há uma finalidade e tudo passa a ser uma casualidade objetiva. O ser humano precisa adoecer e morrer para que nasça uma nova vida. A gestação é uma doença que morrerá no nascimento. A renovação da espécie mata o humano em vida, pois sua abnegação faz com que ele se prive para servir a esse novo ser vivente.

A vida passa a ser um constante assassinato, no qual, é preciso a morte em vida para se perpetuar. O humano obedece ao discurso que ele mesmo criou e introjetou, numa forma de se perenizar. Percebe-se, claramente, a fragilidade da existência quando o humano passa a fabricar materiais (novos humanos) para suprir as peças que vão se deteriorando. A existência humana se resume na reprodução da espécie, todavia, a finalidade ainda é algo a ser descoberto. O humano procura entender tudo que está em sua volta, mas fecha os olhos para se manter cego e fingir uma completude e uma satisfação.

O humano não percebeu que sua existência está condicionada a estímulos que o próprio determinou; que as prisões da existência o deixaram sem propósitos maiores e que tudo termina em uma morte com o alento de uma vida após, para aliviar a angústia da rápida passagem pelo mundo. As pegadas repetitivas do humano são rastros de uma vida sem nenhuma finalidade, todavia, com passos marcados por ilusões e buscas infindas; felicidade baseada em regras existenciais.

Realmente, uma existência, na qual, tudo se resume em nascer, reproduzir e morrer é algo a ser contestado – pensado, pelo menos. Nascer para quê? Reproduzir o quê e o quem? E morrer por quê? O humano nasce com a vida transbordando, mas com um final já escrito. No instante do nascimento os genitores morrem – morte em vida. A nova vida vem em busca de um caminho, de um percurso, mas que se repetirá e morrerá antes do final – a repetição perene. Ao nascer se mata para que se viva uma nova história e no trajeto da vida iniciada, o humano se mostra viril e independente; não usa e não precisa das bengalas que só será adquirida com os discursos incutidos pelo próprio humano. Sua independência faz com que, esse humano, tenha a ilusão de uma liberdade existencial, mas logo as prisões lhe são mostradas. A fé vem como uma libertação, como a chave dos portões de uma eternidade. O humano começa a se contentar com o devir e esquece que veio, apenas, para confirmar o acaso. O humano existe por conta de um acidente e não para um propósito. Essa ideia é abominada para que, assim, o humano fuja da realidade e crie expectativas na vida. Perceber que é fruto de um acidente cósmico e que sua existência se deu por causa da extinção de outra espécie, coloca o humano como mero coadjuvante nesse filme chamado existência.

Não há como procurar objetividade quando se vem de um acaso. O que se procura é muito pouco para a imensidão da existência. Destarte, a vida ainda é algo estranho e vago, talvez, uma pilhéria do universo. O humano busca sentidos para se completar e se valorizar diante da existência, mas sua finitude fugaz lhe comprova, todos os dias, que ele não passa de um objeto de um mundo, no qual, ele pensa que nasceu como a espécie escolhida.

Arregalai-vos os olhos; o verbo não conjugou o humano.

Mário Paternostro