Como Vencer a Timidez


Chamou-me a atenção uma reportagem em revista sobre as crianças tímidas. Uma das coisas que nunca se deve dizer a uma delas é que ela é tímida, pois isso somente irá acentuar a timidez.

De repente, descobri por que eu era tímido na infância. Todos diziam que eu era tímido. Tímido! Tímido! Parecia refrão de marchinha de carnaval. Talvez porque ficasse vermelho quando os adultos faziam brincadeiras sem a menor graça como aquela do “mostra o documento e prova que é homem”. Ou então perguntavam de qual tio ou tia eu mais gostava: do que não fazia este tipo de pergunta, responderia hoje. Mas naquele tempo tudo o que fiz foi acentuar a minha timidez.

Outra que me matava era nas festinhas. Sempre, é claro, havia uma menina bonita. E lá vinham os parentes. Convida ela para dançar, para sair. Vai e lasca um beijo logo de cara que ela apaixona. Mas que gente sem a menor falta de senso. Como pode? E eu ia ficando cada vez mais tímido, vermelho e enrustido. A reportagem justamente cita uma situação como essa: não force a criança a fazer amigos. Minha família ia além, queria me transformar logo de cara em um amante latino irresistível.

Família é uma coisa boa, mas faz um estrago imenso na vida da gente quando é despreparada. Naquele tempo todos eram. Ninguém era muito afeito a livros e a única psicologia infantil que conheciam era a do “cala a boca menino”. Como queriam que eu me soltasse em um ambiente adverso como aquele?

Sem saber como agir,  eu  ficava na minha, calado e arredio. E quando vinha uma visita e de repente queriam demonstrar que eu era bom em matemática, história e geografia? Fala quem descobriu o Brasil, fala. E eu ali, com cara de artista de circo fracassado sem saber o que dizer. Então vinha a sentença: desculpa, ele é tímido. Como se fosse uma doença crônica e incurável.

A matéria jornalística afirma para não obrigar a criança a expor-se, apresentando-se em peças teatrais ou quadrilhas, quando ela não quisesse. Eu ia para as quadrilhas até com certo entusiasmo. O duro foi quando uma vez me escolheram para ser padre. Padre? Eu usava um grosso par de óculos – vai imaginando aí o meu tipo. Encabulado, calado, feio e ainda usando óculos. A minha vida, na minha cabeça, não apresentava qualquer perspectiva de sucesso. Como eu ia dançar com alguém sendo padre? Jamais me casaria ou teria filhos. Sabe qual o efeito que uma coisa assim causa a uma criança?

Acabei sendo padre na festa. Foram milhares de gozações. O apelido me perseguiu por vários anos. Minha atitude séria e sóbria só servia para agravar o problema. O pior foi quando alguns familiares ainda afirmavam: você podia ser padre mesmo. Tem cara, leva jeito, usa óculos e ainda não agarra as meninas na festa quando a gente fala para fazer. E olhem que eu tinha 9 anos. Responda por favor, meu caro leitor: eu estou errado?

Acredito que só me livrei da timidez aos poucos, lá pelos 19 anos. Contudo ainda apresento certas amarrações. Nunca consegui chegar em uma festa e dar um beijo de cara em uma garota, o que hoje é uma coisa natural. Quando eu era mais jovem ainda costumava-se namorar meio à antiga. Acabei tendo muitos namoricos, paqueras, conheci uma boa pessoa, me casei e tenho filhos. De vez em quando alguém da família ainda recorda-se: é incrível, se você visse como ele era tímido!