FOI NOS ANOS DE CHUMBO...
 
Como está na moda falar,  tratar e discutir do tempo dos chamados “anos de chumbo”, que passou o País,após 1964,conforme disse,em crônicas anteriores,era repórter destacado para cobrir os acontecimentos,em Sampa, no extinto DOPS,(DEPARTAMENTO DE ORDEM POLÍTICA E SOCIAL),na praça general Osório,pelo jornal o “ESTADO DE S. PAULO”.Por conseqüência,tenho muita coisa para escrever para aqueles que não viveram essa fase da história brasileira.Aliás,até acho que muita gente nem havia nascido,mas já trabalhava,nessa notável profissão.Não imaginam como é saudoso para mim o barulho de uma rotativa funcionando,do porte do “estadão”.A “Gross”.Pura emoção.Há gosto para tudo e para todos,nesta vida.O jornalismo que fiz era empolgante.  Volto com outro fato que considero importante,aos colegas e companheiros que viajam e escrevem,com sabedoria e talento, pelo “recanto das letras”. A rigor, graças à internet,estou aqui para falar algo e matar a curiosidade de algum segmento,que gosta disso,  quer  acompanhar e saber de épocas já passadas.Assim   fico como escriba de “águas que já rodaram moinho”...Peço desculpas ao me aturarem,piedosamente,eis que em nenhum outro meio de comunicação estaria tão livre e solto,para tal missão...Se havia uma música com sucesso que não se deve acreditar em pessoas “além dos 30 anos”(?)-(sic),imaginem meu caso...se isso fosse verdade e levado a sério!!
Vamos aos fatos.Foi numa tarde modorrenta e sem grandes acontecimentos na repartição política e social quando veio a notícia de que a famosa artista,cantora, VANJA ORICO,a ”Maria Bonita”, aquela do filme de cangaço,(em preto e branco),que contava a história de “Lampião”,premiado e consagrado no Brasil e Exterior, estava ela na portaria do DOPS,lá embaixo,para visitar um “detento-político”,que se encontrava nos porões do velho casarão... Surpresa e ousadia! Ninguém visitava ninguém...
A notícia logo correu  pelos corredores do quarto andar –onde a gente ficava,no meio dos  delegados de polícia- estes nada gostaram da “ousadia” de VANJA, querer visitar alguém que estava recolhido.Nunca alguém ousou visitar “preso político”,até então.Mas mesmo assim,essa corajosa mulher,entrou pela porta principal e chegou ao quarto andar(onde havia a diretoria,delegados e só três colegas da imprensa). Com toda simpatia,  jeito feminino,além da fama que tinha,não teve o diretor  Andréas Shmith como negar à ilustre e famosa dama  a subida do detento para o andar superior,onde estávamos...VANJA ORICO, era pura simpatia, carioca,filha de diplomata, falava cinco línguas.  Disse-me em particular, que “vinha visitar antigo namoradinho”,com quem tinha o melhor apreço e consideração. A bela venceu as feras... Em pouco tempo, apareceu o “ex-namoradinho” da atriz: VICENTE BURZA, foi aí que soubemos ,BURZA era médico cardiologista...e que estava “recolhido”,fato que até então desconhecíamos...A bem da verdade, algum segredo,o DOPS não revelava à imprensa,embora a convivência era pacífica e sem problemas.
Conforme se observou pela pessoa de VICENTE BURZA- era uma pessoa frágil,baixinho,pele descamada e cheia de pintas,quase ruivo,em todo o corpo e nunca- ao que se comentou- não deveria ter sido mesmo um “namorado”, da linda e monumental atriz...Em todo caso,ela falou estava falado...VANJA ORICO era atraente,linda,morena,sexual...Hoje,não sei como ela está...é ainda mais conhecida no Exterior do que em seu próprio País.Isso,é comum,no Brasil.O pessoal daqui não é de memória curta.Na verdade,é sem memória mesmo.Ficou famosa pelo filme e canções,entre elas:”sodade”!
Ficaram os dois numa sala cheio de  confortáveis poltronas,perto da sala da diretoria e não se sabe o que conversaram...a não ser o pessoal do andar de baixo,que sempre gravava as conversas reservadas,atrás das poltronas tinham  micro-microfones,previamente instalados pela polícia política.A KGB fazia o mesmo... Até hoje não se soube o que conversaram.Ficou isso numa fita,que alguém ouviu... O público externo não sabia dessa malandragem dentro do DOPS...Nós,da imprensa sabíamos,mas “cautela e canja de galinha não faz mal a ninguém”.Até mesmo os telefonemas de dentro para fora e ou vice-versa, eram gravados...Nada escapava à turma do quarto andar,inclusive em todo o DOPS.Os delegados –segundo se comentava- eram os melhores e mais cultos dentro da instituição.Havia um que falava a língua russa. Por outro, nunca vi o indigitado, delegado Fleury- morto,anos depois, misteriosamente na Ilhabela. Nem cheguei a conhecê-lo.O “pau comia mesmo” é no DOI-CODI,no bairro de Higienópolis,em bairro de luxo...no DOPS,ao tempo que lá fiquei -como repórter- nada de anormal,ante a situação que se vivia,quanto a caça aos chamados “subversivos”...
Lembro bem,que o “ESTADÃO” abrigava em seus quadros,jornalistas portugueses perseguidos pelo regime do presidente Salazar(Portugal),trabalhavam por aqui, e , ficaram alguns deles detidos no DOPS ,sem motivo algum. Sairam de uma ditadura e aqui pegaram outra... Tive a difícil missão de conversar com o diretor do “casarão”,delegado Andréas para livrá-los,eis que não havia perigo nenhum à ordem social,em deixá-los detidos.A solicitação/missão veio da diretoria do jornal, e o diretor do DOPS,imediatamente,me atendeu. Foram soltos os jornalistas-lusitanos,que o “jornalão” tinha o maior carinho... Acho que cumpri uma missão...acho que ganhei alguns pontos do alto escalão-diretoria.Por outro,liberdade de imprensa e de jornalistas são coisas sérias!
Voltando:VANJA ORICO –depois do encontro reservado- pediu-me carona, pois ia ao centro da cidade e,  eu ao jornal,na rua Major Quedinho.Peguei um taxi.  Ela me contou que estava morando em Paris,e estava vivendo com um diretor de uma fábrica de automóveis na França e que logo deixaria o País.Voltaria a Paris.Convidou-me para assistir um show musical que daria na rua 7 de abril,à noite,naquele dia,na boate “Stardust” e prometeu um CD. Não fui.
Quanto a VICENTE BURZA –após dias saiu do DOPS. Rumou logo em seguida para Moscou,onde segundo soube estava clinicando e vivendo,lá ao lado dos colegas soviéticos,em sua especialidade. O País perdeu um cardiologista e nunca mais vi a maravilhosa,talentosa e perfumada VANJA ORICO...mulher assim,a gente nunca esquece...Onde está você querida VANJA??