Placas, livros e celulares
Pode-se dizer que Brasília emplacou. Repentinamente, começaram a surgir aqui e ali, primeiro próximo ao estádio, e depois por todo o Plano Piloto, placas de sinalização para os turistas que para cá virão por ocasião da Copa das Confederações. E são placas que sabem falar inglês. O próprio estádio Mané Garrincha agora também é “National Stadium”, e provavelmente apenas porque não poderia ser “Silly Garrincha”. Nosso Parque da Cidade virou, naturalmente, “City Park”, o que nos transforma praticamente em Nova Iorque. E até mesmo a Rodoviária do Plano Piloto mereceu uma placa, devendo ser chamada pelos turistas de “Brasília Bus Station”, o que, decididamente, é a principal melhoria feita no transporte público do DF nos últimos anos.
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Nas paradas de ônibus da Asa Norte existe um projeto para empréstimo de livros. Enquanto espera o ônibus, o sujeito tem à sua disposição uma prateleira com livros que ele pode pegar, levar pra casa e devolver quando quiser. Boa parte dos livros não é muito atraente. São livros didáticos antigos, ou livros de Administração e Direito Civil, aqueles que o pessoal lê para passar em Concurso Público. Outro dia encontrei um chamado “Legislação de Terras no Pará”’, que por pouco eu não confundo com Guimarães Rosa. Também achei a “Lei Orgânica de Martinho Campos”, que eu nunca soube que andava promulgando leis por aí.
Vez ou outra acho coisas interessantes, como as “Reflexões sobre a língua portugueza”, escrito por Francisco José Freire e impresso em Lisboa no ano de 1842. O autor não hesitava em chamar de idiotas aqueles que usavam palavras ausentes nos escritores clássicos. Mas sinto uma espécie de vingança ao verificar que logo no prefácio está dito que a linguagem é “parte integrante” da história da civilização.
Há alguns dias encontrei livros do José de Alencar, Rubem Fonseca, Saramago, Stanislaw Ponte Preta... A todos coloquei na mochila, e alguns já devolvi. Tenho ainda lá em casa um do livro do Júlio Verne, que seguramente já poderia ter dado a volta ao mundo em 80 dias no mínimo meia dúzia de vezes, desde que o peguei em uma dessas paradas.
E assim se arruma livros, já que a censura do preço não nos deixa comprá-los.
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E lendo a gente até que aprende alguma coisa. O Mia Couto, escritor de Moçambique, por exemplo, outro dia me ensinou que lá na África o conceito de pobre não se refere a alguém com pouco dinheiro: por lá pobre é quem não tem família.
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Há mais de um mês eu ando sem celular pelas ruas de Brasília – perdi o meu. Como também não uso relógio, posso me considerar totalmente alheio aos horários. De vez em quando eu estico o pescoço para enxergar um daqueles relógios de rua, que também mostram a data e a temperatura – e que, como todo mundo sabe, no momento em que batermos o olho, estarão mostrando sempre a informação que não nos interessa. Para conseguir acordar de manhã, fui obrigado a ressuscitar um rádio-relógio, que já tem bem os seus quinze anos. Ao menos acordo com música. E estou almoçando melhor também, sem acessar rede social alguma. Meus amigos, eu recomendo que percam o celular de vez em quando, e fiquem ao menos algumas semanas sem arrumar um novo.