Minha sombrinha azul
DEPOIS DA CHUVA
Minha mãe perdeu a sombrinha,
no portão de casa, foi roubada.
pendurou a sombrinha e virou as costas
para arrumar qualquer coisa,
conversando.
O sol piscou alegre de volta
como se risse de minha mãe.
Um homem dobrou a esquina, apressado,
envergonhado por carregar debaixo do braço,
uma sombrinha de mulher,
depois da chuva.
(Do livro inédito Herança)
Relendo este poema verídico, lembrei - me de minha sombrinha azul.
Eu tinha uma sombrinha azul, linda. Cor do céu mais azul. As ponteiras e o cabo eram metálicos prateados. Eu andava com ela para baixo e para cima. Quando chovia, é claro. Quando a chuva passava, ela se transformava em apoio. Lerda que sou, quase a perdi várias vezes. Esquecida em balcões de banco, de bancas de jornais e revistas, de lojas. Mas me lembrava logo que me via sem ela e voltava em desabalada carreira. Ah, que tempos bons esses em que eu podia correr!
Um dia eu entrei em minha Fábrica de Pães, a Padaria Rocha, e a coloquei pendurada próxima ao balcão de lanches. Nunca imaginei que não estivesse segura. Mas não estava. Fiz uma coisa aqui, outra ali. Quando resolvi entrar para o escritório e fui buscá-la, não a encontrei. Fiquei desolada.
Refletindo hoje em dia percebo que a perda foi bem mais forte do que eu poderia imaginar. Conseqüências vieram, sempre isso já é praxe. Se algo acontece algo muda no mundo.
DEPOIS DA CHUVA
Minha mãe perdeu a sombrinha,
no portão de casa, foi roubada.
pendurou a sombrinha e virou as costas
para arrumar qualquer coisa,
conversando.
O sol piscou alegre de volta
como se risse de minha mãe.
Um homem dobrou a esquina, apressado,
envergonhado por carregar debaixo do braço,
uma sombrinha de mulher,
depois da chuva.
(Do livro inédito Herança)
Relendo este poema verídico, lembrei - me de minha sombrinha azul.
Eu tinha uma sombrinha azul, linda. Cor do céu mais azul. As ponteiras e o cabo eram metálicos prateados. Eu andava com ela para baixo e para cima. Quando chovia, é claro. Quando a chuva passava, ela se transformava em apoio. Lerda que sou, quase a perdi várias vezes. Esquecida em balcões de banco, de bancas de jornais e revistas, de lojas. Mas me lembrava logo que me via sem ela e voltava em desabalada carreira. Ah, que tempos bons esses em que eu podia correr!
Um dia eu entrei em minha Fábrica de Pães, a Padaria Rocha, e a coloquei pendurada próxima ao balcão de lanches. Nunca imaginei que não estivesse segura. Mas não estava. Fiz uma coisa aqui, outra ali. Quando resolvi entrar para o escritório e fui buscá-la, não a encontrei. Fiquei desolada.
Refletindo hoje em dia percebo que a perda foi bem mais forte do que eu poderia imaginar. Conseqüências vieram, sempre isso já é praxe. Se algo acontece algo muda no mundo.
- Passei a procurá-la pela cidade toda. Uma sombrinha azul, tão linda como ela era, não podia simplesmente sumir. Tinha que estar com alguém. Acontece que a encontrei, por acaso, nas mãos de uma mulher que descia a rua. Uma mulher tão triste que a usava para se proteger do sol. Uma mulher tão feia que doeu meu coração. Pode ser que seja, pode ser que não, pensei. No quadro que as duas formavam uma imagem em que a sombrinha parecia ser a única alegria daquela vida triste e feia. Com uma pontada no coração, deixei para lá.
- Passei a colecionar sombrinhas, preferencialmente as grandes. Tenho sombrinhas espalhadas por toda parte. Em gavetas. Tenho uma que trouxe de Barcelona, outra de Amsterdã. Só no jarro de barro na esquina da escada tenho quatro. Todas lindas. Quando me perguntam: O que quer ganhar como presente? Respondo fácil: Não me dê livros, a menos que sejam seus. Os outros, gosto de escolher. Me dê uma sombrinha, você nunca vai errar.
- Mas se alguém pensa que eu fiquei sem minha sombrinha azul com acabamentos prateados está muito enganado. Ela se transformou em matéria de sonhos. Quando algo de bom me acontece, revisto meus gambitos com uma meia calça de listas vermelhas horizontais, visto uma túnica que comprei em Porto Seguro, faço duas marias chiquinhas, abro minha sombrinha e saio dançando, rompendo todas as barreiras, levando comigo o telhado e pairando acima de tudo. Vou até as nuvens onde executo passos mirabolantes, pulando de uma em uma e vou subindo, até alcançar as estrelas. Está certo, acordo sempre em minha cama e o teto continua lá, as meias listadas que não tenho continuam guardadas na gaveta dos sonhos, minha túnica no armário. Mas que aventura! Não troco isso por nada. (09/06/2013).