EU COMI UMA BARATA! (reedição)
Quando eu estava com 12 para 13 anos de idade, eu ainda morava com os meus avós no Bairro Guanabara, na linda cidade de Joinville. A nossa casa ficava distante apenas uns 500 metros da casa dos meus tios onde o fato aconteceu. Eu ia brincar com os meus primos e coleguinhas quase que todas as tardes. Na parte da manhã eu tinha que ir para o colégio. Aproveitando a folga de um feriado eu estava por lá a brincar como sempre; mas, as horas se passaram e já era mais ou menos uma hora da tarde quando eu e meu primo voltamos. Então, fui convidado para almoçar.
Aceitei como de costume, pois era comum eu e os meus avós almoçarmos ou jantarmos de vez em quando na casa dos meus tios. Todos já tinham comido, menos nós dois. Ao lado da mesa da cozinha e encostado no canto, ficava o fogão à lenha que fumegante esquentava as telhas decoradas com algumas teias de aranha, abandonadas e já pretas pela fuligem. Foi construído de tijolos maciços e com um perfeito reboco alisado pelo tempo de uso. Era rodeado por uma pequena faixa de chão batido. O piso era de madeira assim como o resto da casa.
O forro de tábuas finas e largas pegava somente do lado dos móveis da cozinha. O meu primo foi no banheiro e eu morto da fome, assim que fui servido comecei a devorar o prato de feijão pantagruelicamente. Eu já tinha dado alguns bocados... O feijão com pouca dose de farinha misturada (eu gosto assim), deixava o pirão bem molinho. Alguns nacos de linguiça misturados liberavam um cheiro gostoso, estava uma delícia. A minha tia era descendente de alemães e cozinhava muito bem. Pedaços de chuchu, tomate, cebola, cominho, colorau, pimenta, alho e folhas de louro complementavam o divino angu. Lá pelas tantas mastigadas eu senti na minha boca uma coisa como pele ou casca fina, meio que crocante e mole ao mesmo tempo, com um gostinho estranho e um cheiro naftalinado de não sei o quê, era uma coisa diferente.
Achando que talvez fosse um pedaço de linguiça meio passada e insossa, não me importei muito e engoli. Eu continuava a mastigar e engolir. Foi quando eu senti o toque de um espinhar na língua e uma pequena forma comprida com um gosto amargo estourar na minha boca, que eu realmente percebi e vi após cuspir, uma perninha traseira ainda agarrada com o ovo amassado da barata que (com certeza, tonta do calor do fogão, inesperadamente cometeu o suicídio caindo dentro da panela sem querer. Lá ela morreu, ferveu e esquartejou-se)... Senti um tremendo nojo que chegou a me arrepiar os pelinhos do braço... Eu deixei de comer naquele instante, fui lá fora e soltei só uma água preta pela boca, mas não senti muita vontade ou fiz esforço para vomitar, talvez pela surpresa da situação.
Como não havia ninguém por perto, (o meu primo tinha ido tomar banho, desde a hora que chegamos) eu joguei o resto do feijão com tempero de barata para o cachorro (que já aguardava ansioso). Depois que eu soltei mais algum liquido da boca, eu a enxaguei bem com a água da torneira da pia do banheiro e escovei os dentes com a primeira escova que eu encontrei. O meu avô ainda não tinha aparecido para me pegar e levar para casa, aliás era coisa que não me preocupava muito porque eu sabia que com certeza ele viria. Eu estava sim, era pensando, quando eu iria me livrar daquele bafo de barata que exalava da minha boca, quando eu conversava com alguém...