FELICIDADE GERADORA DE SAÚDE
Pode ser que pareça bobagem, ou fantasia da minha cabeça, mas me sentia como se pisasse em pregos, dormisse com formigas ou me alimentasse de veneno, todos os dias, e foi assim por muito tempo, três ou cinco anos, não sei ao certo quanto durou, pra mim pareceu mais uma vida inteira (...).
Havia perdido minha mulher em um acidente de carro, e me vi sem chão, no abismo da vida, tinha apenas duas escolhas: pular ou me manter ali, sem ela e totalmente sem mim. Depois de noites voltei pra casa, o cheiro ainda estava lá, as roupas sobre a cama, os porta retratos me fuzilavam, sentia uma dor quase que insuportável, que me rasgava por dentro a sangue frio, ecoava dentro do peito a voz, que me fez feliz tanto tempo, e hoje não era mais que lembranças. Apenas boas lembranças.
Foi uma grande rasteira que levei da vida, que deixou aberto em mim, cicatrizes profundas, um vazio em me sentir vivo. Depois disso tudo, vivia como se não fosse eu, doente e de cama, totalmente recluso do mundo. Alimentava-me mal e evitava o contato com as pessoas, sofri muito, e esse muito ainda era pouco, pelo que passei, pelas noites vazias que chorei, ouvindo o silêncio que gritava ao pé do ouvido. Desabou o mundo sobre mim, grandes ruínas se fizeram sobre meus pés, os dias me empoeiravam, e os meus sentimentos se faziam ruins, tomados pela solidão, amarrados pela tristeza, amordaçados pelas lágrimas que rolavam e desapareciam sobre o meu corpo, fraco e sem vida.
Foram processos dolorosos, e eu negava a ajuda de quem fosse, a dor era minha, somente minha, que mania é essa que as pessoas tem de tomar a dor do outro pelo braço e levar pra longe. Abrir os olhos todo dia pela manhã era assustador, era como entrar em um inferno diário, um buraco sem fundo, ser puxado pra morte, e se ver morto.
Deixei sem perceber a vida escapar, sair de mansinho, me deixando pra trás, mais uma vez sozinho. Deixei a vida ir, e ela foi. Deixei de me amar e assim aconteceu. Eu me deixei. Meus pulmões incham e esvaziam, como uma bexiga pronta a estourar e cair por terra.
A vida lá fora não te espera, ela voa com o vento, na esperança em ver bons tempos. Olhei-me no espelho e vi pela primeira vez depois de muito tempo sofrer, alguém que precisava se amar de novo: - É Zé a vida acontece do lado de fora dessas paredes, e ela continua (...).
Todos os pensamentos negativos me adoeceram, mas procurei ajuda, procurei profissionais que acenderam a chama da esperança, que havia sido apagada com um balde de água por mim mesmo. Sentia-me velho e sem forças, tão sem vida, tão sem mim, tão fora de casa. E com uma vida toda pela frente. Reconstruí-me, foram meses, foi uma aceitação da minha própria vida, dos acontecimentos que me acinzentaram, das frustrações, problemas e perdas que me deixaram a ver navios, nas águas de sombras.
Nunca mas serei o mesmo, mas serei eu, de novo, reinventado, e é isso que importa. A vida se encarregou de me trazer boas vibrações e outras vindas, encontrei a paz interior e restabeleci a minha saúde, não tenho mais recaídas e me sinto bem, havia me esquecido como era se sentir assim, leve.
Hoje minha mulher vive na memória, de onde jamais sairá. Dei outro significado às coisas e um novo sentido a vida, me libertei dos fantasmas do passado, me desprendi do que já não existe mais aqui, deixei os dias acontecerem, um depois do outro, sem pressa e com um alívio enorme no coração. Quem pode ser mais feliz, se não aquele que vive os sentimentos mais humanos que se pode imaginar, e mesmo assim se sentir capaz de continuar, e tentar outra vez.
- E hoje eu sei que eu sou o grande causador da minha felicidade, sou o responsável em me sentir vivo, e sou capaz de amar novamente, e fui eu quem me fiz assim. Que a gente não desista de nós, e que a vida não desista da gente. Pois eu jamais desistirei de mim!
Porque a felicidade é geradora de saúde.