UM NOVO DIA... 40 ANOS DEPOIS !

UM NOVO DIA... 40 ANOS DEPOIS !

"...continue seu caminho / resistindo aos

espinhos, / porque um novo dia há de

chegar". (trecho de versão livre, deste

Autor, de "Farewell Angeline",

música de BOB DYLAN)

"...vou vencer -- sei que vou -- / leve o

tempo que fôr!" (trecho de versão livre

do rock progressivo "Daytime", deste

Autor, música da banda alemã JANE)

"Refuto a idéia de que a Arte é um campo

para iniciados (...). Não dá para estabelecer

fronteira entre alta e baixa Cultura". AFONSO

MEDEIROS, prof. de História da Arte/UFPA,

no jornal DIÁRIO DO PARÁ, 24/05/2013

Meu sonho de ser cantor (de minhas próprias músicas) é antigo, muito antigo, tem seguramente mais de 40 ANOS. Nasceu (ou cresceu) vendo e ouvindo os compositores de samba do Bloco carnavalesco que se apresentava na quadra de terra batida (vulgo "terreiro") bem ao lado de nosso barraco, no Morro dos Cabritos. Meu sonho de ter uma filmadora é quase da mesma época. Aliás, faltou pouco para eu tê-la, já por volta de 1970. Participei do leilão de uma estatal carioca e saí de lá com uma geringonça do tempo da I Guerra Mundial -- de 1914 até 1917, para quem não sabe -- que nunca funcionou direito.

Era na verdade um projetor de slides, com 3 lentes distintas... a estória desse vexame suponho que esteja no texto "Os 'Micos' que vivi", parte 1.

Sempre entendi que fotografia registra atos & fatos pela metade, já um filme, mesmo mudo, inclui na fita o acaso e as eventuais "testemunhas" involuntárias dele. Favelados, tivemos sim nossa filmadora por volta de 1974/75, com rolinhos de película muito caros e que só duravam 5 minutos. Junto com ela, o projetor de plástico azul GIOCA ROYALE, quase um brinquedo, que "lixava" o filme todo. Mas, foi o suficiente para fazer o histórico registro (entre 1976 e 79) dos jovens mestres do Grupo Senzala, todos êles em plena forma artística, inclusive Mestre LUA (de Canjiquinha, hoje "Lua Rasta"), jogando no nosso Morro com um menino de 10 anos. Talvez seja a única filmagem do "Lua", com excessão de sua breve participação nas cenas de maculelê do filme "Cordão de Ouro".

Com ou sem sonhos, a Capoeira levou o menino -- de SOL no nome de origem tupi -- para as geladas terras parisienses... o resto da (sua) História o próprio jovem Mestre a conta e canta em diversos filmes e jogos, a partir dessa facilidade chamada de "videoclip", feita até com celulares. Meu sonho de ter uma filmadora "renasceu" em 2009, quando surgiu o "Garagem do Faustão" e também o "Caldeirão do Huck" passou a inscrever tais "filmetes" e vi nisso uma oportunidade para mostrar meu trabalho de compositor, senão também o de cantor.

Recorri a um amigo, gentilíssimo, Davi Soares, que me filmou cantando por 90 segundos. Era preciso "baixar" o video da "maquininha", pouco maior que 1 caixa de fósforos, para o site dos programas. Hora e meia de espera em frente ao computador... E NADA! Nova tentativa no dia seguinte... E NADA! O video era muito "pesado"!

Em março/abril de 2010 uma loja de eletrodomésticos do Rio doou mais de 200 máquinas digitais de fotografia ("cybershots") para a platéia do programa do Huck. Vi ali uma oportunidade de conseguir a filmadora, tendo enviado um email "pedindo" 500 reais para isso. Julgava que, ao invés do dinheiro, eu receberia a tal máquina. Lêdo engano: após informarem que a diretoria analisava meu pedido, "me fecharam as portas", digo, o acesso ao SAC da loja. Computadores, que não fazem NADA do que quero ou preciso, conseguem barrar minhas mensagens com a surrada desculpa de "caixa cheia" (box of email is full).

Em 2011 me fiz seguidor do "dono da loja" (no Twitter), sugerindo-lhe que me enviasse a filmadora em confiança -- na época apenas 80 reais, depois R$ 90,00 -- que eu pagaria. Quem tinha cartão de crédito quitava a "bugiganga" digital em suaves prestações de 12 reais. Miseráveis como eu e 50 ou 60 MILHÕES sem o "dinheiro de plástico" só podiam comprar à vista. O dono fingiu não perceber a necessidade (e o desespero) por trás do pedido e o ignorou.

Nessa mesma época ouvi no "Mais Você" uma daquelas frases iluminadoras com as quais Ana Maria Braga encerra seu belo programa. "Se você quer o que nunca teve, faça o que jamais fez!" Fiz então o que jamais pensei... recorrí a um candidato a vereador. Para minha surpresa, conhecia a nossa luta como jornaleiros nas ruas do bairro (entre 1987 e 2003) e, agora, enquanto recicladores, "lixeiros" informais na boca de "vizinhos" que nos detestam.

Ainda mais surpreso, assisti estupefato êle não hesitar nem 3 segundos para concordar com meu pedido, embora lhe dissesse que "não votava, detestava Política e o estava procurando apenas como... empresário". Com a "interferência" de uma espécie de "secretário" do comerciante -- que me dificultou como pôde um contato com o seu patrão -- levei 3 semanas para receber, em 2 parcelas, os R$ 120,00 solicitados.

Nesse ínterim, a câmera MIRAGE DC06 de R$ 90,00 virou miragem... "desapareceu" da coluna de ofertas da loja virtual contactada e de outras lojas (Citylar, Insinuante, etc) curiosamente todas com as mesmas ofertas e idênticos preços. A isso se chamava antigamente de DUMPING, manipulação de mercado. Com o dinheiro na mão, saí de loja em loja à procura da "miragem", digo, da filmadora baratíssima. Mais decepções: o que está no Mundo virtual, SÓ PODE ser comprado via computador. NÃO EXISTE em exposição nas lojas. (Isso tem cheiro de... contrabando!)

Decidimos então comprar um modem (da TIM - Terror da Internet iMóvel), R$ 99,00 praticamente jogados fora. Jamais conseguimos instalar corretamente o "brinquedinho" -- um celular completo, com o tal modem incluso, sai por 70 ou 80 reais... alguém entende isso?! -- os meses foram passando, mudamos para a CLARO com "resultados" iguais e lá se foi ano e meio.

Eis que nos jornais de Belém, em dez./2012, anunciam a criação de um site de "vaquinha virtual", o tal crowdfunding. Já sondara anos antes um site desses, sem muito entusiasmo, tinha regras demais e facilidades de menos. A realidade do brasileiro não nos permite "importar" projetos americanos, sem adaptá-los minimamente... é insensibilidade demais ! Os valores dos projetos são os ideais, com céu de brigadeiro e vento de popa à proa, mas com 80% da meta ainda assim o mesmo projeto seria concretizado. No entanto, vi sonhos com 94% de doações feitas serem eliminados. Hesitei muito antes de me inscrever, pobre decente detesta pedir o que quer que seja. Por outro lado, "desconfiava" que artista amador ou poeta popular não provocam interesse do internauta tupiniquim, mais inclinado a ver sacanagens e fofocas, bundas e bobagens, do que Cultura. Dos males, o menor: amigos de 20, 30, 45 anos atrás -- que eu não vi durante esse tempo todo -- foram exatamente os que contribuiram, para minha alegria. Infelizmente, não deu... os que doaram receberão em casa os valores investidos!

Abro um parêntesis: em meados de 1990, por muito pouco não me transformei em cineasta, com direito à câmera profissional e verba para filme de qualidade, com "storyboard", cadeira de diretor e tudo. A criação do CCCP - Centro Cultural de Capoeira do Pará pretendia divulgar essa dança-luta em toalhas, postais, cadernos, cartões telefônicos e... em filmes. Um empresário do Canadá, DAVID G. DUNAWAY, dispoz-se a bancar tudo e distribuir o filme nos EUA e Europa. Mas, surgiu um vilão no caminho e jamais conseguimos contactar plenamente e empresa.

Tivemos nos CORREIOS do bairro nosso inimigo feroz, nos dando prejuízos seguidos. Adiante, mudei nossa Caixa Postal para outra Agência, lá em Belém, apenas para constatar - já no primeiro dia -- que a tal APT "funcionava" com a mesma liberdade (?!) da anterior. Em pouco tempo encerramos o CCCP (em maio/1992) e arquivamos todos os planos e sonhos relativos à Capoeira no Pará.

(ver... professorleiteiro.blogspot.com.br/2010/01/estava-escrito.html )

Voltemos à nossa estória... faltando 10 dias para o fim do prazo, soube por acaso que outro amigo, CARLOS RAUDA -- fotógrafo profissional que nos presta favores desde 1987 -- poderia fazer 2 "chamadas" rápidas, espécie de "videoclip caseiro", exatamente como pretendo realizar quando tiver 1 filmadora. Meu objetivo é tão-somente deixar registradomeu trabalho de compositor (e letrista), não quero ser mais um na lista dos que morreram sem deixar NADA de suas obras gravado, como os amigos Abiezér Silva, "seu Botão", Mário Marques e, talvez, Waldilson Albuquerque, que a bebida consumia rapidamente, nas calçadas da Vida, na última vez que o vi.

Os 2 apelos digitais não mudaram em nada minha situação, diria que sequer foram vistos. São bem amadores, a "crueza" das imagens é proposital... embora eu tenha 3 gaitas-de-boca optei por imitar o som de uma delas. (www.youtube.com/user/NATOAZEVEDO)

A Internet se tornou o "universo do grotesco", do mal-feito proposital, do ridículo e do patético, enfim, reino supremo dos fracassos e dos "desastres". Logo, minha "estréia" segue a lógica (?!) e a linha que predomina no cyberespaço... quanto pior, melhor !

Fica claro que, com os recursos que (não) tenho, é só o que posso fazer: cantar "à capela" -- como diriam nossos tataravós -- minhas composições, de forma precária e despretenciosa, sem sequer um reles violão para acompanhar-me. Adiante, se o Destino permitir, posso usar desenho animado (ou HQs) para ilustrar as canções e, quem sabe, riffs eletrônicos imitando guitarras, baixo e bateria.

Dizem os antigos que "quem tem padrinho não morre pagão"! Quando menos se espera, eis que surge no fim do túnel um Sol que me ilumina a Vida. Por email, dias antes de terminar minha frustrada tentativa de conseguir uma filmadora, um amigo prometeu me enviar a máquina... se o Correio não atrapalhar! Portanto, para amargura dos que torceram CONTRA, em breve o Internet verá e ouvirá os 'trinados senís" de um sonhador quase insano. "I'll go back, baby", diria o Exterminador do Futuro!

"Só eu sei, meu Senhor, / o tamanho dessa dor / que a Vida me tem feito enfrentar"... mas, "não quero ver findar / minha Histõria / sem ter sentido / o gôsto doce da vitória". Amigos literatos e músicos, com os quais conviví em Belém desde 1987/88, "partiram" sem ter deixado nada seu publicado ou gravado, para os parentes e pessoas que os admiravam. Não quero ser mais um nessa triste lista, certamente não serei mais um. Se der sorte, além dos raros amigos leais que me lêem e acompanham, talvez consiga algumas centenas ou milharesde outros mais. Ai, então, será a GLÓRIA !

"NATO" AZEVEDO (poeta, escritor, compositor)

ANANINDEUA, Pará, BRASIL