O VELHO NA ESTRADA DESERTA
Como num sonho povoado de inquietações desencontradas, transbordando figuras fantasmagóricas inexplicáveis capazes de provocar temores e tremores, vi-me numa enorme estrada deserta povoada pelo silêncio aterrador. Aqui e ali árvores secas, crestadas pelo sol, arbustos acinzentados de poeira acumulada, pedregulhos amontoados uns sobre os outros sob o manto azulado do céu sem nuvens, além do absoluto nada ante meus olhos espantados
Eu estava só, sem compreender, atoleimado, perdido, sem rumo, dormindo ou acordado? Como eu saberia? Era tudo tão completamente estranho e funesto, por demais esquisito e complicado. Havia chegado àquele lugar inóspito e arrepiante por mim mesmo ou ali fora deixado por alguma razão desconhecida e por pessoas que eu jamais vira?
Arrepiei-me dos pés à cabeça quando vi o velhinho com o saco nas costas, cabelos desgrenhados, dentes estragados num sorriso apagado. Mas o que me chamou toda a minha atenção sobre ele foram seus olhos mortos rodando de um lado para o outro como se numa forçada tentativa de furar a barreira da escuridão. Um horror escabroso, sinistro, pavoroso. Meu primeiro desejo foi sair dali fugindo às pressas, correndo o mais rápido possível, para qualquer lugar longe dali. Então ele falou, e sua voz soava estranhamente cavernosa e assustadora:
_ Ei você! Você! Me ajude, me ajude por favor!"
Estremeci apavorado. Olhei para um lado da estrada e vi a imensidão sem fim do asfalto; olhei para o outro avistando o mesmo cenário. Então olhei para trás, onde havia matagal e pequenas veredas, sempre trêmulo, assustado, não, morto de medo! Medo que aumentou quando voltei meu olhar para o velho, pois ele vinha se aproximando cuidadosamente para não cair em algum buraco nem tropeçar em qualquer obstáculo. Meu coração disparava, algo me dizia que aquele homem esquisito e cego vinha me pegar.
Sem pensar nem mesmo um segundo, tirando forças de onde já tudo havia exaurido, mas ainda assim, alimentado pela adrenalina, corri loucamente para qualquer direção, sem rumo, desde que ficasse bem longe da iminente ameaça consubstanciada na forma do cego segurando uma bengala e vindo ao meu encontro. Virei-me enquanto corria desabalado e dei conta do velhinho esbravejando sozinho e brandindo a bengala no ar, ameaçador, enfurecido, louco, louco.
Quando mais me afastava dele mais corria e olhava para trás, a ver se por alguma sinistra razão misteriosa o tal idoso também estaria correndo em minha direção. Mas não, ele parecia gritar e esbravejar ainda mais alto, sacudindo a bengala contra o vento, aos poucos desaparecendo de meu campo de visão. E eu só parei de correr, já esbaforido, quando deparei com um grupo de escoteiros vindo na direção contrária à minha. Resfolegando, arfante, parei diante deles e gritei o quanto meu fôlego ainda permitia:
_ Tem um velho doido lá na estrada que pega menino!!!
Os escoteiros sorriram como se achassem ingenuidade o meu comportamento. Um deles, já maduro, replicou-me:
_ Esse velho é cego?
_ Sim! - respondi apressado
_ Ele não é doido, é o chefe dos escoteiros e estávamos à procura dele.