CRÔNICAS BONAERENSES (41º dia) – El “echiño” brasileño
Fico impressionado e enojado ao mesmo tempo com a criatividade brasileira. Enquanto lia sobre a fraude do leite (do leite, cara!! Logo o leite!!) me chamou a atenção como esses asquerosos transgressores da lei, que adicionavam ureia e água ao nosso leite de todo o dia no Rio Grande do Sul, faziam para se comunicar numa região com péssimo sinal de celular. Pediam músicas pela rádio local! A música de um artista era dedicada a um desses salafrários, que sabia, pelo nome do artista, para onde deveria se deslocar. Também me deu asco como o brasileiro ganha dinheiro em cima de coisas que deveriam ser dadas de graça, como na Venda de licenças ambientais e alvarás. Criatividade “a full”.
Mas o jeitinho brasileiro de fazer as coisas, de ganhar a vida em cima das brechas da justiça, também está presente em Buenos Aires. E é impressionante como tem brasileiro ganhando a vida em cima de outros brasileiros. Dentro da crise financeira que vive o país, mandar dinheiro através do banco não é muito rentável. As taxas são absurdas, te pagam pouco pelo real, além de te cobrarem 35 pesos por saque (ao menos para clientes Banco do Brasil). Por isso, o mercado de brasileiros agiotas está a pleno crescimento! Tu depositas na conta de um banco brasileiro desta pessoa na maior confiança e ela vai onde tu estás e te entrega a grana em pesos por uma taxa de câmbio melhor. Há também os que se dizem operadores financeiros, e são verdadeiras casas de câmbio ambulantes. Te pagam bem pelos teus reais ou dólares e assim ganham a vida. Não tenho nada contra, é uma prática que muitas vezes ajuda os brazucas aqui, embora eu fique mais tranquilo com dinheiro na minha conta e saindo pelo caixa eletrônico.
Outra dificuldade que se tem sendo estrangeiro é alugar um apartamento. Como tu não comprova renda suficiente, não tem imóvel na cidade, tem que ser direto com o proprietário. Como o proprietário não te conhece, não sabe o teu passado e não prevê o futuro, ele te pede muitas garantias, como 3 meses de aluguel antecipados que ficam guardados com ele e ele só te devolver quando termina o contrato, isso se não tiver nenhum tipo de avaria na casa, e eles sempre encontram alguma e esse dinheiro não volta. Bem, alguns brasileiros que já dispõem de uma situação econômica boa na cidade, já são estão estabelecidos há tempo aqui, podem alugar apartamentos. Então alugam um, dois, três, vários apartamentos. Assim, começam uma prática que é ilegal, a sublocação dos quartos destes apartamentos. Vão atrás de brasileiros desesperados e sem lugar pra morar e, por uma quantia mais baixa que a do mercado, em torno de 500 reais por mês, alugam um quarto compartilhado. Uma prática muito antiga e que acaba ajudando quem não é daqui, quem não vai ficar muito tempo, quem não se importa em dividir um quarto talvez com um roncador que estremece os vidros da casa com seu ronco ou com uma desorganizada que pendura as calcinhas no ventilador pra secar.
Mas o que me indignou com o jeitinho brasileiro nesta semana foi outra coisa. Aqui em Buenos Aires, temos que tomar turno para fazer quase todas as coisas que envolvem o governo. Não se pode simplesmente aparecer no Tudo Fácil ou no Itamaraty. Tu marcas pela internet – ou pelo telefone, se tu tiveres sorte e paciência – um horário e o local mais próximo da tua casa que tu precisa ir pra fazer tal trâmite governamental. Uma bela solução para acabar com as filas para os argentinos, uma bela fonte de renda para os brasileiros! Faz quase um mês que eu tentava marcar turno para conseguir meu certificado de antecedentes penais e não conseguia. Alguns amigos também não conseguiam marcar turno para outras coisas, afinal, tudo precisa de turno! Não dava. Daí que um amigo meu, através do facebook, se deparou com uma alma aparentemente caridosa que disse ter um turno e que lhe podia ceder. Pediu pra que ele entrasse em contato por inbox. Aí que veio o golpe. Ele vendia o turno, no dia que tu quiser, por 300 pesos. Isso é crime! Um serviço gratuito do governo argentino, que muitos brasileiros usam e precisam, sendo comprado por uma dúzia de outros brasileiros, que vendem (não é nem revendem, pois é gratuito!) como uma fonte de renda! Felizmente, eu consegui marcar o meu pelo telefone.
Até onde vai a criatividade putrefata e asquerosa do brasileiro? Essa ação de tergiversar as leis, que é chamada com eufemismo de “jeitinho brasileiro” ou de “malandragem” está se espraiando pelo mundo. Garanto que se tu fores à China agora, vai ter brasileiro vendendo algo que lá é de graça. Claro que isto não é exclusividade do brasileiro, aqui se vê na rua venda e compra de dólares, aluguel de carteirinhas para jogos de futebol... mas só o brasileiro sabe como ninguém no mundo fazer disso uma profissão, com divulgação, ponto de venda, etc... O jeitinho brasileiro está em Buenos Aires. O jeitinho brasileiro está pelo mundo. E depois, estes mesmos corruptos da lei querem xingar os corruptos da política que vendem licenças ambientais e alvarás ou aqueles que colocam ureia e água no leite. “Brasil, um país de todos”, e todos tentando passar a perna nos outros.
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¿Qué pasa, Fábio?
Eu quero ser feliz
Eu quero ser Feliz. E eu quero que meus amigos sejam felizes. Eu quero ser feliz ao lado dos meus amigos. Eu quero sair pra degustar alguns chopes e não ficar bêbado. Eu quero estar com gente honesta. Eu quero escutar mentiras sinceras.
Eu quero conhecer gente nova. Eu quero conhecer o mundo. Eu quero amigos que me bastem. Eu quero que meus pais venham me visitar. Eu quero parar de tomar remédios. Eu quero comer churrasco todos os domingos e não engordar. Eu quero jogar futebol todas as semanas. Eu quero ir na Popular sem cadeiras no novo Beira-rio. Eu quero ver meu time campeão da Libertadores de novo, mesmo que depois perca pro Mazembe.
Eu quero viver da música. Eu quero ganhar o dinheiro suficiente pra viver em Buenos Aires. Eu quero viver e morrer em Buenos Aires. Eu quero tomar mate nos dias ensolarados de inverno em Palermo. Eu quero comprar bugigangas em San Telmo. Eu quero que o Noel Gallagher lance outro disco. Eu quero que o Paul McCartney toque outra vez na Capital porteña. Eu quero tocar na Capital porteña. Eu quero ter um trabalho estável.
Eu quero ter alguém pra amar. Eu quero ter alguém que mereça ser amada. Eu quero ter um cachorro. Eu quero morar numa casa na Grande Buenos Aires. Eu quero ter filhos. Quero que meu filho seja um grande músico e minha filha uma grande tenista. Eu quero escrever um livro sobre Porto Alegre. Eu quero tomar bons vinhos. Eu quero envelhecer ouvindo Beatles. Eu quero morrer antes de ficar caduco.
Mas, no momento, eu só quero ser feliz, pois o resto é consequência.
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Dica da semana:
Feira de San Telmo e Parque Lezama (http://www.feriadesantelmo.com/) – E quando a grana aperta, sempre tem coisas boas pra fazer de graça. Pegar um mate, dar uma passeada pela feira de San Telmo nos domingos, escutar o barulho dos tambores do candombe e terminar de recorrer a Calle Defensa deitado na grama verde do Parque Lezama, sob o sol que acalenta as temperaturas negativas que virão no final de semana. Este é meu plano.