Não sei dimensionar exatamente quando começou minha paixão por feiras livres. Minha lembrança mais remota é acompanhando meu pai na compra de frutas e legumes. Éramos sempre acompanhados por um balaieiro que agasalhava as compras no balaio. Lembro que meu pai ficava me chamando pelas minhas longas paradas e quando eu fazia que não o escutava lá vinha ele a me rebocar...
            Aos poucos fui aprendendo a riqueza que é a feira e facilmente me apaixonei. A mistura de frutas criando um forte odor, doce, embriagador, as cores vivas das flores e verduras e principalmente a mistura de pessoas. Tudo é sedução.
           Somos recebidos pela feira de flores. Uma profusão de tons, de cheiros, de beleza. Sempre voltava com um ramalhete pronto para alegrar minha casa. Geralmente beneditas, minhas preferidas.
          Logo após, a feira de fumo de rôlo. Nessa eu apressava os passos. Minha repulsa por tabaco vem de longe. Mas o fato deles serem enrolados em paus me chamava a atenção, não o suficiente para me aproximar.
         Seguia-se a feira do barro. Aí eu deitava e rolava. Panelas de todos os modelos, quartinhas, gamelas, tinas e uma infinidade de calungas feitos de barro. No fim dos barros, vinham as cestas, balaios e garajaus de cipós, palha ou cisal. A mulher das bruxas nunca faltava. Era um balaio de personagens, noivos e noivas, padres, vaqueiros ou tão somente bonecas encantadas.
          A rua do queijo propositadamente ao lado da rua do doce. Queijo de coalho com doce de jaca, casamento indissolúvel. Como resistir?
          Lá no fim da rua ficavam as famosas casas das primas. Mesmo funcionando a noite, sempre escapava uma dama sonolenta depois de uma noite de labuta. Um resto de música ainda tocava... Sempre ignorei a pecha de mulheres de vida fácil. O que eu via eram mulheres tristes, cansadas que escondiam no excesso de pintura um ar de desilusão.
         Os violeiros, espalhados pela feira inteira, encantavam com seus cantos. Os poetas de cordel estendiam seus varais de livretos, com causos surpreendentes. Geralmente com voz rouca, aprevoavam a poesia popular... A mais genuína e pura expressão da poesia nordestina.
         Eis porque mergulhar numa feira do nordeste é se lambuzar de vida, é se refestelar de poesia, é saciar a fome com doce de jaca e rapadura e a sêde com uma cachacinha de cabeça, é se fazer povão e quem sabe se apaixonar e virar nordestino


A foto é do fotógrafo Roberto Coura.