Eu almoçava calmamente na casa de minha sogra, numa tranquila rua de um subúrbio carioca, quando um burburinho me fez chegar à janela.
Ao lado de um carro da Light, estacionado junto ao meio-fio, um homem baixinho e atarracado, apenas de short, e suando por todos os poros, gritava furioso: Se cortar, eu mato! Mato, entendeu?
Do alto da escada, um crioulo, ou melhor, um afrodescen-dente, de quase dois metros de altura, alicate em punho, perguntava para o outro cara que estava ao lado do carro, de prancheta na mão: O que é que eu faço?
- Corta - dizia o da prancheta.
- Se cortar, morrre - dizia o baixinho com um revólver na mão, logo, mais convincente.
- Mas o que é que eu vou dizer pro meu chefe? - vociferava o crioulo.
- Se cortar não vai dizer nada, porque morto não fala. Eu mato primeiro você, depois o seu amigo da prancheta.
- Pô, doutor, o senhor tá dificultando o nosso trabalho. Mandaram a gente cortá, nos corta, pô!
Já mostrei pros senhores que a conta está paga - dizia o baixinho. Se o banco não notificou à Light, é problema deles. Eu é que não vou ficar o fim de semana sem luz, tendo pago direitinho, como manda o figurino, no dia do vencimento. Aliás nem paguei no dia, paguei na véspera, como o senhor pode ver aqui na minha conta.
- O que é que eu faço? Corto ou não corto?
As pessoas, atraídas pelo bate-boca, começavam a chegar e já se podia considerar razoavelmente boa a plateia.
Alguns começaram a apostar. Logo apareceu um, mais esperto, que começou a anotar as apostas.
- Vamos, minha gente! Façam as apostas. A senhora aí, madame, vai de “mata” ou “não mata”? São só dois reais.
- Ah, meu filho, vou de “mata”. Depois de todo esse espetáculo o seu Herculano não vai poder voltar atrás. Se os caras cortarem ele mata mesmo, ou ficará desmoralizado aqui na rua, onde mora há tantos anos.
A plateia aumentava. O pipoqueiro resolveu mudar o seu ponto, aproximando-se do local, esperando aumentar a sua féria.
O medigo do bairro, o chamado Pudim de Cachaça, pedia “um trocadinho para um morto de fome”, pelo amor de Deus.
- Sai pra lá, meu filho - disse dona Genoveva, que participava de todos os eventos importantes do bairro - nós agora estamos preocupados é com a vida daquele lá de cima da escada.
Naquele bairro pacato, qualquer acontecimento era novidade e todos os vizinhos já estavam participando.
Baleiro, bala, baleiro...chocolate crocante três por um real.
É a limonada gelada, quem vai querer? Vamos freguesa na promoção do dia!
Dona Genoveva foi em casa buscar seus panos para enxugar pratos, com babadinhos de crochê. Afinal, nunca se tinha tanta gente assim reunida. Ela não podia perder a oportunidade de faturar uns trocados.
Do alto da escada o crioulo já estava começando a se impacientar.
- Vamos resolver logo essa parada, meu irmão! Eu não tenho a vida toda para esperar que vocês se decidam. Tenho mulher e filho me esperando em casa.
O da prancheta começou a amolecer, olhando o tamanho da arma na mão do baixinho encolerizado.
Olhou pro crioulo, olhou pro baixinho, encarando-o bem.
O baixinho repetiu: Se cortar, morre!
Desce daí, King Kong - disse o da prancheta. Vamos baixar noutro terreiro.
Enfiou a prancheta debaixo do braço, entrou no carro e partiu.
Ao lado de um carro da Light, estacionado junto ao meio-fio, um homem baixinho e atarracado, apenas de short, e suando por todos os poros, gritava furioso: Se cortar, eu mato! Mato, entendeu?
Do alto da escada, um crioulo, ou melhor, um afrodescen-dente, de quase dois metros de altura, alicate em punho, perguntava para o outro cara que estava ao lado do carro, de prancheta na mão: O que é que eu faço?
- Corta - dizia o da prancheta.
- Se cortar, morrre - dizia o baixinho com um revólver na mão, logo, mais convincente.
- Mas o que é que eu vou dizer pro meu chefe? - vociferava o crioulo.
- Se cortar não vai dizer nada, porque morto não fala. Eu mato primeiro você, depois o seu amigo da prancheta.
- Pô, doutor, o senhor tá dificultando o nosso trabalho. Mandaram a gente cortá, nos corta, pô!
Já mostrei pros senhores que a conta está paga - dizia o baixinho. Se o banco não notificou à Light, é problema deles. Eu é que não vou ficar o fim de semana sem luz, tendo pago direitinho, como manda o figurino, no dia do vencimento. Aliás nem paguei no dia, paguei na véspera, como o senhor pode ver aqui na minha conta.
- O que é que eu faço? Corto ou não corto?
As pessoas, atraídas pelo bate-boca, começavam a chegar e já se podia considerar razoavelmente boa a plateia.
Alguns começaram a apostar. Logo apareceu um, mais esperto, que começou a anotar as apostas.
- Vamos, minha gente! Façam as apostas. A senhora aí, madame, vai de “mata” ou “não mata”? São só dois reais.
- Ah, meu filho, vou de “mata”. Depois de todo esse espetáculo o seu Herculano não vai poder voltar atrás. Se os caras cortarem ele mata mesmo, ou ficará desmoralizado aqui na rua, onde mora há tantos anos.
A plateia aumentava. O pipoqueiro resolveu mudar o seu ponto, aproximando-se do local, esperando aumentar a sua féria.
O medigo do bairro, o chamado Pudim de Cachaça, pedia “um trocadinho para um morto de fome”, pelo amor de Deus.
- Sai pra lá, meu filho - disse dona Genoveva, que participava de todos os eventos importantes do bairro - nós agora estamos preocupados é com a vida daquele lá de cima da escada.
Naquele bairro pacato, qualquer acontecimento era novidade e todos os vizinhos já estavam participando.
Baleiro, bala, baleiro...chocolate crocante três por um real.
É a limonada gelada, quem vai querer? Vamos freguesa na promoção do dia!
Dona Genoveva foi em casa buscar seus panos para enxugar pratos, com babadinhos de crochê. Afinal, nunca se tinha tanta gente assim reunida. Ela não podia perder a oportunidade de faturar uns trocados.
Do alto da escada o crioulo já estava começando a se impacientar.
- Vamos resolver logo essa parada, meu irmão! Eu não tenho a vida toda para esperar que vocês se decidam. Tenho mulher e filho me esperando em casa.
O da prancheta começou a amolecer, olhando o tamanho da arma na mão do baixinho encolerizado.
Olhou pro crioulo, olhou pro baixinho, encarando-o bem.
O baixinho repetiu: Se cortar, morre!
Desce daí, King Kong - disse o da prancheta. Vamos baixar noutro terreiro.
Enfiou a prancheta debaixo do braço, entrou no carro e partiu.