MAIS DETALHES DO GUARIBAS

(*) Edimar Luz

Eram maravilhosas as plantações nas vazantes do rio Guaribas. Ali se podiam ver milhares de bem construídos canteiros que continham separadamente alho, cebola, cebolinha, coentro, batata-doce, alface... Com muita habilidade, os trabalhadores construíam seus canteiros utilizando as areias do próprio rio. Além das sementes, naqueles canteiros eram empregados esterco principalmente de bovinos, que era misturado com paul especialmente de carnaúba, acrescido à areia do canteiro. As plantações eram aguadas por meio de levadas construídas nas vazantes.

O alho colhido nas vazantes era transportado até a casa do agricultor em jumentos arreados com cangalha e dois jacás, bem como em carroças puxadas a burros, em carros-de-bois e até em bicicletas e carrinhos de mão.

Lembro-me de que naquele período do ano, entre os meses de maio, junho e julho, o leito do rio Guaribas, que possuía águas cristalinas, proporcionava certo microclima bastante agradável e salubre à nossa população. Era, na verdade, um microclima mais suave que as regiões circundantes.

Era indiscutivelmente importante a água do rio para o nosso povo, pois além de propiciar o abastecimento da população e favorecer enormemente a irrigação, ainda era utilizada em inúmeros outros fins. A areia, por sua vez, era empregada também na construção civil em nosso município, assim como nos outros municípios que compõem esta microrregião. Pode parecer estranho, mas é verdade que a areia servia até mesmo para arear as panelas picoenses em alguns casos.

Podia-se também observar naquela época o trabalho pesado e diário das lavadeiras do rio Guaribas que aproveitando as águas límpidas e transparentes do rio, lavavam as roupas de sua família, ou de outras que a contratavam para a execução desse serviço. Aquelas lavadeiras costumavam aplicar em algumas roupas o anil, uma substância azul corante que possui propriedades tintóricas.

Nas chamadas “passagens” e bebedouros era o local aonde se levava o gado para beber água, e onde ocorria também a lavagem de veículos. As áreas cercadas eram propriedades privado-particulares, onde era muito grande a presença ou existência de plantações. É importante lembrar que somente se cercava as propriedades do leito do rio na época do cultivo das vazantes. Naquela época Picos ficou conhecida nacionalmente como A Capital do Alho, pois era grandiosa a sua produção. Graças ao rio Guaribas e ao trabalho estafante nas vazantes, era realmente grande a produção de alho, e, por isto mesmo, a nossa cidade teve a honra de receber e ganhar merecidamente esse título, que durante muito tempo ostentou com distinção e orgulho. Orgulho de nós picoenses.

Era notável também a presença de aves ribeirinhas, como garças, jaçanãs, socós, martins-pescador, tetéus (quero-queros), carãos, saracuras três-potes, pintos-d’água, batuíras-de- bando e até maçaricos, marrecas, e muitos outros, além dos pássaros mais comuns da nossa fauna regional, que sempre freqüentavam as árvores de sua mata ciliar. Algumas espécies de aves estranhas (e algumas delas até de grande envergadura) costumavam, às vezes, pousar em seu leito e margens durante a noite, pois além de poderem ser vistas em algumas ocasiões, elas quase sempre deixavam vestígios: penas, fezes, rastros... Por falar em mata ciliar, há de se notar a extrema importância de sua preservação, visto que ela evita a erosão e o assoreamento do leito do rio.

Os rios também fornecem alimentos em forma de pescado. E a pesca no rio Guaribas era praticada principalmente com tarrafas, anzóis e puçás (aqui denominados landuás), sendo os peixes mais comuns: mandis, piaus, traíras, curimatãs, corrós, piranhas, combás, piabas e cascudos (caris e chibatas); além de uma grande quantidade de cágados e muçuns; e mais recentemente a presença de arraias que o Guaribas herdou do rio Itaim. Há de se destacar que embora predominantemente marinhas, algumas arraias se adaptaram à água doce, podendo ser vistas no curso de rios.

Já como fonte de lazer, havia os banhos e as manhãs de sol, pois praias fluviais se formavam ao longo de seu curso, sendo, inclusive, utilizadas também para a prática de esporte, especialmente o futebol amador ou futebol de várzea.

É inegável a importância extraordinária do nosso rio Guaribas no passado. Hoje, suas águas turvas e escuras estão poluídas e contaminadas em conseqüência do grande número de esgotos, detritos e lixos jogados impiedosamente em seu leito. A degradação do meio ambiente afeta de forma cada vez mais drástica a vida no Planeta. Por isso, a preservação da natureza é, na verdade, uma questão que preocupa de fato o mundo inteiro, uma vez que ele (o mundo) infelizmente está correndo sérios riscos por causa das desenfreadas e constantes agressões ao meio ambiente.

Obs. Do meu livro GUARIBAS: LEMBRANÇAS E HISTÓRIAS DE UM RIO.

(*) Edimar Luz, é escritor, cronista, poeta, articulista, compositor, memorialista, professor e sociólogo, formado em Recife - PE.

Picos - PI, 05 de novembro de 2004.

Edimar Luz
Enviado por Edimar Luz em 21/05/2013
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