Um exame delicado

Para mim todo exame médico é obtuso, isto sem mencionar os nomes dos remédios e as pomadas milagrosas que surgem a cada dia. Com o passar dos anos as doenças ficaram mais afloradas e complicadas.

Manter um bom nível de saúde hoje em dia não requer apenas bons hábitos é necessário que tenhamos um excelente plano de saúde e muita paciência para enfrentar as filas e os preços dos exames e medicamentos. Quem não conta com estes recursos é melhor não ficar doente.

Esta semana um dos meus amigos mais próximos foi procurar um Clínico Geral depois de muita resistência e fartas conversas com o psicólogo. Sabia que precisava ir, mas andava protelando a consulta semanalmente, mesmo com todos os argumentos que lhe eram dissecados. Estava prevendo o pior, pois ainda não havia feito o temido exame de toque retal. Sabia que não escaparia desta arapuca, tendo em vista que já passara dos cinquenta anos de idade. É bem verdade que já passou da hora recomendada pelos especialistas e gozadores de plantão que, aliás, tornam as coisas mais difíceis do que talvez precisassem ser de fato.

Segundo relatos, o clínico era um cidadão extremamente educado e atencioso: mediu sua pressão, pediu que pesasse, fez um eletrocardiograma na maior paciência, tudo certo. De posse desses dados, foi anotando os outros exames que deveriam ser feitos em laboratório.

Disse-me que os seus olhos foram acompanhando a caneta do médico que deslizava pelo papel vagarosamente. Cada registro era um alívio, mas a relação foi crescendo, crescendo... nem ao menos piscava. Quando a consulta caminhava para os últimos detalhes, suspirou aliviado. Não havia sido solicitado o exame de próstata. Respirou fundo. Certamente pensou: estou são e salvo. Em seguida o médico pegou outra folha e escreveu em letras bem grandes: PSA. Meu amigo disse que quase tive um ataque de nervos.

__ Você já fez o exame de toque?

__ Não.

__ E o PSA?

__ Também não.

__ Pois então está na hora de fazê-los.

O coitado saiu da sala com aquele pedido nas mãos ainda trêmulas. Não queria acreditar no que estava lendo. Quase pediu para o médico descartar aquela solicitação, chegou a pronunciar a palavra próstata. Mas o médico foi irredutível:

__ Faça os exames o mais rápido possível.

Como não havia outro remédio, foi para o trabalho e danou a perguntar aos colegas se eles já haviam se submetido a tais exames. Na verdade ele estava procurando alguém que houvesse feito o tal de toque retal. Pensava que seria uma verdadeira catástrofe. Depois de muita conversa descobriu que um dos colegas acabara de fazer o exame com uma médica. Adorou a ideia. Ficou radiante, achou que o problema estava resolvido. O tal amigo o confortou dizendo que ela era delicada, bonita, jovem e divertida. Era tudo que ele haveria de pedir a Deus naquele momento. Porém, tudo na vida tem um preço, quando ele foi virando as costas o amigo falou:

__ Só tem um probleminha, ela era jogadora de basquete na juventude.

__ Ah, é?

Continuou procurando um profissional que tivesse uma mão menos certeira. Até que teve a ideia de consultar com um japonês. Correu a lista telefônica de cabo a rabo, até encontrar um nipônico que pudesse lhe atender. Depois de muita relutância ligou para o Dr. Tadeu, viu logo que o nome não era lá essas coisas, mas quando ele falou ALÔOO, quase teve um ataque de nervos, a voz parecia um trombone desajeitado, aquela coisa cavernosa, muito grossa.

__ Doutor Tadeu?

__ Sim.

Gaguejou, acho até que estava amarelo. Sem meias palavras disse:

__ Desculpe, foi engano.

Com aquela voz, só podia ser um lutador de sumô. Deveria ter uma pegada nas mãos que nem lutador de judô. Desligou correndo.

Já estava ficando apavorado. Os dias estavam passando e não tinha o que falar para o seu médico, sabia que ele precisava dos exames para ter um diagnóstico mais preciso de sua saúde. Justo ele que sempre se vangloriou de sua condição física, sempre disse que nunca havia ficado doente e, agora, estava em palco de aranha.

Como não tinha o costume de ir a médicos e vendo que suas tentativas não estavam dando certo, resolvi solicitar a ajuda de sua secretária para marcar a consulta. Pediu a ela que marcasse com um especialista, a esta altura do campeonato já sabia que teria que enfrentar qualquer um. Passou o dia todo na expectativa, até que no final da tarde ela lhe disse que a consulta estava marcada e que a secretária do urologista ligaria para confirmar o fatídico dia e horário.

Quando a secretário ligou, ele ficou radiante, a voz era de uma deusa, a educação era esplêndida, um doce de pessoa, não tinha nada a ver com a voz barroca do doutor japonês.

No dia e hora marcada, chegou ao consultório bem antes de sua vez. Tempo suficiente para folhear algumas revistas que estavam em uma mesa de centro na sala de espera... não conseguia achar graça em nada. Uma centena de piadas sobre o exame de próstata estava à sua disposição, provocando longos arrepios.

Quando a secretária chamou o seu nome, dirigiu-se a ela reticente.

__ Posso fazer uma confissão?

__ Sim.

Respondeu ela prontamente.

__ Se eu sair de lá “alegre”, por favor, tome uma providência.

Quando entrou no consultório, o médico pediu para que tirasse a roupa e vestisse um jaleco muito estranho, tapava tudo, menos a bunda. Uma coisa horrorosa! Mas fazer o quê?! Lá foi ele para o sacrifício. Com certeza depois daquela consulta nunca mais seria o mesmo...

Na saída olhou para a secretária todo sorridente:

__ Quando será o retorno?

No que ela respondeu.

__ Agora é só no ano que vem.

Meio que desajeitado resmungou:

__ Que pena!

Pedro Cardoso DF
Enviado por Pedro Cardoso DF em 29/03/2007
Reeditado em 08/10/2017
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