Sua obra
Sua obra
Você deve adorar a sua obra, é o que parece! A sua escrita, realmente, é de admirar; suas canções têm muito que falar; suas poesias são de um conteúdo abismal; os contos refletem comportamentos; as crônicas apontam e denunciam. Você deve mesmo ser um sujeito prolixo de observações. Está contente com tal afirmação, é? Mas a sua obra tem você ou é, apenas, alguns eu-líricos inventados para dar o recado? Como? Quer dizer que em tudo você está, mas nem tudo tem você? Realmente, dialogar com alguém que vive nas entrelinhas e propaga frases subliminares, é terrível.
Você se percebe em sua obra? Sim, não! Que resposta dúbia. Quer dizer que buscar você através dela é impossível? Você deve brincar com a gente! Entendi! O erro é aplaudir o autor e não a obra. Mas, não foi você foi quem sentiu? Quer dizer que quem tem que sentir é o leitor? E você, o que sente? Hum! Sente os sentidos da vida e através dos sentimentos do mundo a obra nasce, quase, à revelia do autor. Você é louco mesmo e ainda ri.
O que você quer dizer, afinal? Como? Tudo, mas o tudo que nem sempre é alcançado? E onde está a resposta? Sei! A resposta está nas entrelinhas, mas com olhos viciados de mundo, não se consegue ver. Hum! Não sei se pergunto ou se me calo. Você parece guardar a sete chaves o conteúdo. Entendi! Tudo está explicito, todavia, a vida camufla para se defender e manter o silêncio e a submissão do ser humano. Como? Sei! A verdade assustaria a humanidade e o escândalo acordaria a sensatez. E o que tem sua obra com isso? Arrogante! Você está afirmando que através dela pode ser encontrado o rastro da verdade. Tudo bem! Mas você disse que nunca tem certeza de nada! O quê? A certeza é apenas o caminho e a sua obra é como uma bússola? Você, então, é uma rosa dos ventos!
Em qual das produções você destaca como a mais próxima da perfeição? É piada, é? Todas correspondem ao que você propõe? Certo! Que resposta! A perfeição é a meta a ser alcançada e só o Poeta está mais próximo dela. Presunçoso! Até entendo, sei que não é fácil caminhar por vários caminhos e conseguir chegar sempre aos objetivos, mas você não está se supervalorizando? Como assim? O valor são as pedras e afagos que a sua obra recebe? E o que mais é ofertado na obra? O quê? Sei! O discurso foi ecoado, mas nem todos entendem e entenderão as palavras que povoam a sua obra. Você percebe que nem todos têm ouvidos para ouvir a profundidade do pensamento de um Poeta multifacetado?
A sua obra é de grande valia! Nunca duvidei do seu talento, mas você se arrisca demais e expõe, em demasia, o seu talento, talvez, você esteja sangrando e nem perceba. O Poeta tem hemorragias de criatividade e você, certamente, deve estancá-la com a sua produção incessante. Cansa produzir tanto? Sei! Cansa a inoperância intelectual e os fragmentos discursivos permeando a arte e tudo que contribui para o aprisionamento do ser. Mas, sempre, irá existir tal ociosidade intelectual! Como? Sei! A arte é a forma de colocar sentidos, no qual, o mundo vilipendiou com a busca de uma vida, simplesmente, pela vida. Lindo! Mas que sentido? Sentidos e verdades? Ah! Não existe, apenas, um sentimento e a verdade é pluralizada, pois não há completude na existência. Ok! É duro ter que concordar com você, mas sou obrigado a aplaudi-lo. Aliás, sua obra é uma arte que merece afagos e tapas, mas para beijá-la e esbofeteá-la, é preciso entender o que está além do que é proposto. Certamente, os beijos são dados sem sentimentos e os tapas, por despeito. Você riu! Você percebeu que tudo o que escreve e toda a sua obra é um beijo e um soco na face de quem, apenas, busca parte e não arte?
Há tanto para dizer, entendo, mas há tão poucos para ouvir. Deve dar desgosto tal situação! Não? É estimulante? Você é mesmo louco! Mas o mundo é dos loucos e você sabe muito bem disso. Riu, novamente! Sei que deve rir de nós em suas obras e deve chorar também, mas o que é o Poeta, senão, um abismo de palavras e sentidos, no qual, desce ao inferno e céu e nasce sempre em uma e morre para renascer em outras.
Você é um suicida e um Lázaro, amiúde! Evoé, Poeta de prolixo talento!
Mário Paternostro