Quando será minha vez?


Lembro-me de uma época em que as crianças não tinham voz
ativa; os pais e os mais velhos eram a ordem e a lei. Às crianças
restavam obedecer ou serem castigadas exemplarmente, e isso
era uma coisa supernormal. Realmente alguns pais exageravam
no castigo e os adolescentes ficavam revoltados com tamanha
ignorância. Nas reprimendas eram empregados rabo de tatu, vara
de marmelo, correia, laço, relho, mangueira, palmatória, fios

encapados e até cabo de aço. Fora os castigos de ficarem ajoelhados
em bagos de milho, trancados em quartos, amarrados, sem roupas
para não fugirem e tarefas inúmeras. Quando o pai chegava do
serviço a casa ficava em silêncio, e faltava pouco para adivinhar o
que ele queria. Apenas um gesto ou um assobio era o suficiente
para acalmar qualquer desavença entre os filhos. Não existia pena
por trabalho infantil e era normal os filhos ajudarem em todas as
tarefas, e, às vezes, trabalhavam eles mais que os pais.
Um amigo mais velho do que eu, um dia me contou que reclamou

para um padre o quanto trabalhava e ainda era espancado
se algo saísse errado. O padre pediu que perdoasse e procuras-se

entender seu pai, pois seu progenitor era um homem muito
ignorante e fora criado nesse mesmo sistema. Daquele dia em
diante, começou a agir diferente em relação a seu pai. Entendeu
seu comportamento, que batia nele mesmo sem ter uma razão,
aceitava os castigos e surras. E realmente não lhe restava outra
opção, infelizmente aquela época era assim. Muito tempo depois
o seu pai veio a falecer, ele não conseguiu chorar, porém no fundo
do seu coração não ficou rancor e compreendia o quanto o seu
pai era um homem xucro que também sofrera em sua criação.
Muitos anos depois se casou e teve vários filhos, e, como foi
criado em um sistema muito rígido, tentou implantar o mesmo
com seus filhos. Nunca espancou nenhum filho, dava algumas
chineladas e castigos. Sua mulher não o apoiava por completo e
começou a ter muitos problemas familiares. Os seus filhos não o
respeitavam como ele respeitou os seus pais, e em muitas das vezes
não conseguia aliados na correção e educação de seus filhos. Diante
deste impasse resolveu procurar ajuda do padre que o aconselhara
no passado. Esse, já com a idade bem avançada, o recebeu de braços

abertos. O padre escutou toda sua lamentação, compreendeu
o motivo de sua insatisfação e até lhe deu razão. Pediu que ele
perdoasse seus filhos de coração, mesmo eles estando errados.
O mundo mudou muito e hoje só se educa com amor, compreensão

e muita conversa. Estamos em uma era revolucionária
e agora é hora e a vez das crianças e dos jovens, temos que ter
paciência e compreendê-los. Esse amigo inconformado com suas
relações me disse:
— No passado fui espancado e escravizado pelo meu pai
e tive que compreender devido a sua ignorância, agora estou
sendo explorado e desrespeitado pelos meus filhos e tenho que
compreender, pois o mundo mudou drasticamente. Quando vai
ser minha vez de ser compreendido?
Realmente algumas gerações tiveram uma vida bem difícil,
sofreram com seus pais e depois com seus filhos devido às

mudanças dos tempos.
 


Kennedy Pimenta