Sobre as bagunças de nossas casas...
Inadmissível, inaceitável, incondicionável (Existe essa palavra?) Imprescindível, na escola e prece dos inadmiráveis. Um brinquedo ali, o prato por lá, aquele talher que a gente só acha dias depois, o papel higiênico que acaba e o estranho não sabe onde está para repor. A toalha que encharca em um instante, o chinelo sem par. Farelo, farelo, sujeira, um pedaço, farelo, farelo, areia, areia, outro pedaço de algo irreconhecível, a cabeça de um boneco, a bolinha do cachorro, mais farelo e mais areia.
Quem nunca teve sua casa como mini cenário de guerra, um verdadeiro ensaio de caos, atire o primeiro rochedo com uma bela praia particular e resort num dia ensolarado. Podem atirar!
Desde cedo somos ensinados que o correto é ser correto, é primar pela ordem, civilização. Cada coisa no seu lugar e cada lugar em seu espaço. Eu particularmente sinto uma certa náusea se tiver que conviver com algo assim durante muito tempo, acho que até adoeço, e de uns tempos pra cá o mundo descobriu que bagunça pode ser bom. Tudo tem limite, e não falo do seu caderno com a capa caindo, jogado a semanas na escrivaninha, ou a embalagem de Yakult que ainda não encontrou seu novo amor: o lixo. É uma questão que vai além do dia a dia, é a bagunça sazonal. Ela tem data marcada já no calendário, e quase hora para acabar. E quando acontece é por um motivo tão bom, mas tão bom.
Somos ensinados desde pequenos que cada coisa deve ficar no seu lugar, e já nos cansamos de ouvir quando pequenos (e grandes também): “Não mexe em nada”. E isso nos condiciona a viver uma vida onde de repente tudo é reto, segue uma linha d e perfeição e rotina. Ordem é sinônimo de civilização, de respeito, de boa impressão. Mas o que você está procurando de verdade e para todos os dias? É a mesma coisa sempre?
Organização total e sempre pode até ser bem bonito, mas é chato demais.
Existem extremos e pouca gente gosta de viver neles. Um ambiente bagunçado demais te causa desorganização das idéias, a mente cansa fácil e parece que você vê quem ali habita não ter nenhum comprometimento com uma vida saudável. Pelo outro lado (extremo) o tapete na porta e os sapatos todos ali, lado a lado. A mesa do escritório com os papéis alinhados no tamanho certo, as canetas todas viradas para baixo, um livro. Tem sinal de organização maior que um livro reto ocupando arestas de uma mesa? Aquele sofá que não se pode colocar os pés, a cortina que se abre toda ou fica fechada. E cozinha? Cozinha é um antro de pecado e deleite para os desorganizados. Aqueles eletrodomésticos todos um ao lado do outro e mais próximos das mãos de acordo com a frequencia de uso , ume exemplar da toalha “semaninha” com o dia certo estendida. E tudo branco, automaticamente a gente faz silêncio nestes lugares, como se o barulho demasiado fosse ligar o liquidificador e ele voar na sua garganta.
Organização demais te deixa desconfortável, sempre em alerta e isso cansa, estressa. Por mais que alguém pareça imóvel, mas no fundo se incomoda. A realidade é: todos temos que ter momentos da desforra, de se acabar, chutar o balde. Até mesmo o mais certinho dos seres... Se bem que certinho é ser assim, com os momentos de escape, de loucura.
E o que é a bagunça se não o rastro de uma história sendo contada? Os passos de um capítulo da vida? Onde tem bagunça tem ação, tem ser humano vivendo de verdade. Então onde quero chegar é que não se preocupem demais com suas bagunças, elas significam que vocês se importam com algo, lutam por uma causa, são vestígios de um dia a dia repletos de afazeres.
Eu sou um caso a parte, reizinho da bagunça, mas sou criativo e consigo faze-la sempre de uma maneira diferente. Preste atenção, se bagunça para você é sempre deixar uma camiseta sobre o travesseiro, na mesma posição todos os dias, um porta retrato virado e um papel fora do lugar, mas colocando-o no lugar de novo sempre, fique ALERTA., isso não é bagunça, é organização, porque bagunça de verdade não se repete, é única, praticamente obra de arte.
Eu aprecio olhar um bom espaço bagunçado e imaginar tudo o que pode ter acontecido ali, como conseguiram chegar naquele nível. É bom pra exercitar a criatividade.
O grande mal é muitas mães, avós, homens e mulheres, geralmente donos das casas se preocupam em receber alguma visita e terem sua cada bagunçada. Lembrem-se então: as pessoas se sentem mais a vontade assim e o julgarem de desorganizados ou não, depende das suas atitudes.
Ter um neto pequeno, ter um almoço de família, ou reunião de amigos e não ter bagunça não tem a mínima graça. As maiores risadas e as melhores lembranças deixam desordem. Mas nada que você não coloque no lugar de novo, nada que não fique pronto para a próxima baderna em questão de minutos.
A pilha de brinquedos, com aquele carrinho que você vai pisar encima e escorregar, aquele copo ainda com resto de bebida que você vai achar em um canto, um cinzeiro que vai virar sobre algo importante, a calça que você queria usar naquele monte monstruoso de roupas. Aquelas festa ou jantar que quando acabar as visitas vão embora, mas a coleção de copos descartáveis com bebidas em todos os níveis e todas as cores vão ficar. Restinhos aqui e ali. Guardanapos com várias amostras de batom e um talher no chão. Isso é o mínimo. Tem aquela de almofadas espalhadas (algumas até rasgadas) na sala, a do seu cachorro com o papel higiênico, a dos meninos com a roupa que vai toda pra fora do armário, a do cara do escritório com a mesa que só ele vai se achar, a da pia e fogão que não se sabe por onde começar, e muitas vezes acontecem todos estes tipos de bagunça integradas.
E então para não ter que se preocupar, para não ter que passar por nenhum trabalho a gente faz como? Se reserva no direito dos outros nos julgarem e espalharem por ai que somos porcos, sujos e outras coisas? Se deixa guardado para não correr o risco de ser alvo de maus comentário da sociedade? Priva alguém de fazer qualquer uma destas coisas? Se priva de um relax gostoso e se controla uma vida inteira? ... Falando em vida, ela está passando e quanto menos fazemos bagunças, menos histórias temos para contar, menos identidade de riso com nosso futuro, menos semelhança de eternidade. Menos resquícios de significado. E falar mal, fazer maus comentários, isso vai existir você fazendo o que for, então aproveita! E por alguns pequenos momentos, deixamos, perdemos grandes momentos porque toda bagunça é na verdade o que se originou de uma grande diversão ou importante obra. Então vamos rir mais bagunçando a cozinha e fazendo receitas erradas com nossos filhos, vamos virar mais suas caixas de brinquedo no meio da sala, vamos beber mais pequenas coisas para deixar nos cantos do sofá, vamos posar para mais fotos com os itens da estante da sua mãe e largá-los no lugar errado. Vamos sorrir mais enquanto limpamos, fazer menos caretas quando colocamos tudo no lugar, porque toda essa magnitude e paz só existe para ser quebrada e manter esta loucura temporária que o seu lar passa de vez em quando, que a nossa vida precisa passar todos os dias.
E quero muito mais disso, porque assim esquecemos um pouco todos os outros problemas, nossos e do universo. Que venham mais confusão deste tipo para todos nós, porque é um pedacinho de fantasia que nossa imaginação deixa escapar pra fora. O Brasil é uma baita bagunça e a gente gosta.
E não tenha vergonha, nem medo, receio ou qualquer coisinha negativa que possamos colocar em nosso caminho, vamos ter é orgulho de termos bagunçado um pouco mais o mundo. E se em um domingo de manhã chegar aquela visita inesperada, não corra pra arrumar tudo e colocaras coisas em seu lugar. Abra a porta calmamente, tranquilamente, sorria (mais) convide para entrar, o leve até toda arruaça e diga expressando toda a alegria do mundo: Olha isso, você gosta? Fomos nós ontem a noite inventando felicidade! E saiba que isso nada mais é do que atitude de quem até se preocupa com preços, cifrões e quantias, mas se importa muito mais com valores, atitudes e significado!... Boa bagunça pra você!
Douglas Tedesco – Maio de 2013