26 outonos
Vez ou outra, se você reparar bem, o outono acontece em Brasília. Geralmente é mês de maio, época intermediária, quando a seca ainda não chegou e ainda há um ligeiro risco de chuva. E normalmente acontece de manhã cedo, na hora de ir trabalhar. O sol fica mais ameno, meio pálido, deixando grandes porções de sombra. Um vento que ninguém lembrava que existia começa a bagunçar os cabelos e derrubar folhas de árvores que eu não conheço o nome. Tudo isso acontece meio rápido, e se a gente não sair do celular acaba nem percebendo. Depois vem o sol do meio-dia e nos lembra que estamos em Brasília, e aqui é ele quem manda.
Na verdade eu estou me lembrando mesmo é de outros outonos, em terras mais frias, em manhãs de 15, quase 20 anos atrás, quando eu era um menino ainda mais assustado que gostava de andar bicicleta no frio-calor da estação. Por uma acertada estratégia divina, calhou que este menino nascesse justamente no mês de maio. E por isso os seus aniversários aconteciam sempre em dias bonitos assim, cheios de sol e sombra, frio e vento. Nunca houve muita festa, mas confortava saber que era dia de outono. Ou talvez não tenha sido bem assim, mas agora tudo faz parte do mesmo pacote de lembranças.
Neste mês, portanto, completo mais um outono. Além de tudo, é a estação que mais tem a ver com o meu temperamento. Sem a felicidade da primavera, sem os excessos do verão, mas também sem a depressão do inverno. Apenas esse jeito de ver as coisas com uma alegria triste. Perceber uma beleza boba e se encantar com ela, sem motivo nem alarde. Ver uma moça particularmente bonita caminhando à sua frente, a quem você conhece de vista, mas não tem intimidade para se aproximar, e provavelmente nem haveria assunto. Somente observá-la com admiração, mas sem desejo, como mais um personagem deste bonito cenário de maio que ora se apresenta.