Prática

Eu exercitei a escrita como um atleta exercita os músculos. Cheguei a sentir o peso da caneta ficar mais leve, mas jamais senti meus traços ficando mais grossos, minhas letras ficando mais encorpadas.

Eu pratiquei a escrita assim como o masoquista pratica self-harm. Meu corpo se tornou a folha, meu sangue se tornou a tinta e a caneta virou a lâmina, mas jamais achei um sádico que me desse esse prazer.

Me orientei e me ceguei na prática assim como alguém que é possuído. Enxergava as letras saindo e marcando, mas no final eu nem sequer sabia o que havia escrito.

Me alimentei da escrita como um obeso de distúrbio de ansiosidade se alimenta de calorias. Agarrei um tema com as duas mãos e só o soltei quando não sobrou uma palavra sequer para descrevê-lo, ainda assim nunca me senti satisfeito.

Criei e destruí mundos perfeitos e imperfeitos como alguma espécie de deus. Fiz minhas criações à minha semelhança e despejei minhas vontades sobre eles, controlei suas ações e limitei suas decisões, mas sempre tornava a perdê-los no tempo, no desdém e na cabeça, tornando-os livres, porém desesperados pela morte de seu Deus.

Corrigi meus erros assim como um perfeccionista o faz. Passei horas tentando encontrar cada falha, cada brecha, cada cicatriz textual, mas nunca encontrando perfeição real no resultado.

Insultei as tendências e os métodos como um aventureiro rebelde. Desvendei e desfrutei de novos mundos, mas apenas acumulei-os aos já existentes da mesma forma que um leitor entusiasmado acumula livros na estante.

Eu procurei de todas as formas possíveis, inspirado em cada metáfora, em cada profissão, em cada tipo de homem, em cada mísero detalhe. E essa minha prática obsessiva e objetivo, tornou em pelo menos revelar meu objetivo? Isso me tornou um escritor melhor? Isso me deu um valor a mais? Eu fiz tudo que trás resultado, mas o resultado nunca foi completo.

Mas fui tudo. E fui todos.

Talvez minha escrita tenha se tornado mais forte em argumentos e palavras significativas, mais intensa nos sentimentos, mais natural no momento da criação, mais extensa e recheada, mais utópica e original, mais inovadora e determinada.

Ou talvez a letra seja apenas letra... E eu só estou mudando a ordem de colocá-las até que elas consigam me colocar em ordem.