Cumprimentar é reverenciar
Mais do que uma atitude social, imposta pela educação recebida no âmbito familiar, cumprimentar outra pessoa ao cruzar com ela é reconhecer sua presença física na dimensão material, sobretudo saudar o ser, ou em linguagem “prembabaiana”[1] a entidade humana que não por acaso passou ou chegou até você naquele momento
Sempre reconheci a importância da presença física, mesmo em tempos atuais de internet com suas redes sociais virtuais, porém uma experiência inesquecível ratificou definitivamente esse meu reconhecimento. Há dois meses estive na residência do Dalai Lama, em Daramsala, uma cidade gelada no Himalaia e o vi conferir uma palestra.
Há muitos anos acompanho o Dalai Lama por textos, imagens e vídeos por admiração. Considerava-o um grande líder espiritual que desempenha uma missão na qual consegue numa linguagem universal tocar as pessoas e chamar atenção do mundo para a opressão chinesa vivida pelo Tibete que obriga a milhões de seres humanos como ele a viverem refugiados em outros países.
Nada do que percebia se compara com o que senti ao contemplar sua presença física. Traduzi minha percepção num primeiro momento, como a pessoa que mais emanava simpatia que eu jamais havia visto na vida. E olha que eu já tive a felicidade de conhecer grandes seres humanos nessas minhas peregrinações espirituais. Antes de ir para Daramsala eu acabara de conhecer o Karmapa em Sarnati e antes do Karmapa, tantos outros desde os 14 anos, quando comecei minha peregrinação.
A energia emanada pelo Dalai Lama identificada por mim como uma “suprema simpatia” e simplicidade, para os adeptos do Budismo do qual é o líder maior, ele é o próprio Buda da Compaixão encarnado. Resguardadas crenças religiosas específicas, o fato é que eu nunca havia estado diante de um ser humano desse tipo, por assim dizer. Nesse momento, entre outras coisas aprendi que nada substitui a presença física dos seres e que dentro de cada um tem tamanha grandeza. Isso deve ser reverenciado, como na tradução do Namastê “Deus que habita em mim, saúda Deus que habita em ti”.
Partindo dessa compreensão, como é possível que eu não perceba a presença de um ser humano? Se eu a percebo, como não saudá-la? Do ponto de vista social seria uma falta de educação fingir que não percebemos uma presença, mas pela perspectiva mais holística, por assim dizer, “não temos um corpo que possui um espírito, somos um espírito vivendo uma experiência corpórea”. Isso muda tudo.
A depender da sua condição social, que é percebida pelos seus trajes, outros símbolos de poder que você possa mostrar, cor da pele ou até posicionamento político, mesmo que seja momentâneo, as pessoas ignoram você, festejam a sua presença, bajulam ou lhe maltratam. Confundidas estão com tantas externalidades propostas pelo sistema, apresentadas pela grande mídia e outros mecanismos sociais de alienação, que muitas pessoas valorizam objetos materiais em detrimento do valor que os seres possuem em si.
Quanto a mim, resta resistir para não sucumbir aos apelos dessa perversidade capitalista e me colocar a disposição no plano físico e em outros a contribuir para que essas pessoas não precisem aprender a reconhecer a humanidade nos outros das piores formas. Que a dor que a vida pode trazer seja substituída por uma permanente onda de amor e cada pessoa reconheça que todas as outras possuem o mesmo valor.
[1] Prem Baba é um mestre brasileiro que possui Ashram também na Índia, cujas mensagens considero especialmente edificantes para os dias atuais da humanidade no planeta.