CEGO, SURDO E MUDO

Um bucadinho de tempo atrás, indo à faculdade, evidentemente de trem e dependurado igual morcego, exatamente como viaja boa parte das pessoas que usa transporte público por aqui. Desliguei a internet do celular e me pus a observar o comportamento das demais pessoas.

Um grupo de três mulheres sussurrava e, de repente, gargalhadas. Você tem dúvidas de que o assunto era sexo? Eita noite boa! Juro que não vi ninguém sorrindo, senão elas. A minha frente um senhor com sotaque nordestino esbravejava que espumava o canto da boca: "cessa parede caí, cê vai alevantar ela suzin”. Uma senhora robusta, com umas trezentas bolsas e mais três meninos, cuidava para não cair e, ao mesmo tempo, consolava o Fernandinho, que nem com reza ‘braba’ sossegava o rabicó.

Quase todo mundo fuçava no celular numa digitação incansável com assuntos intermináveis. Pra falar a verdade a maioria estava com cara de popa. Em poucos minutos pude perceber a vida corrida, agitada, desesperada... Por um instante deixei minha ansiedade de lado para perceber a dos outros.

Uma palestra postada no you tube abriu-me os olhos: "Estamos sempre atrasados e reféns de horários. Tomamos banho com pressa quando na verdade a única coisa que temos a fazer é dormir; preocupamos-nos com compromissos da semana seguinte e chamamos isso de responsabilidade, de vida adulta e moderna. Temos o dinheiro para pagar a conta, mas nos orgulhamos em dizer que enquanto não pagamos não dormimos".

Nosso tempo é consumido por internet, trabalho, filas... Fazer amor? Até pode, mas a ejaculação tem que ser precoce, porque o trabalho é prioridade.

infelizmente não temos tempo para dar atenção aos filhos, mas graças a Deus por ter babá, né? Você aí, fortão, lembre-se de que é mais frágil do que casca de ovo: uma dorzinha qualquer ou a descoberta de um pequeno tumor, já era a autoconfiança.

Antes de descer do trem, religuei a internet do celular, daí em diante tudo ficou como antes: não ouvia, não achava graça e não enxergava. Sumiu o homem do sotaque engraçado; o Fernandinho não me incomodava mais e tampouco ouvia as gargalhadas das três mulheres que falavam sobre sexo. Torno-me agora um sujo falando do mal lavado. Voltei a ser o fortão, o autoconfiante e ter o estado emocional controlado. A saúde? Por enquanto, vai bem, graças a Deus!

Eder Tofanelli
Enviado por Eder Tofanelli em 13/05/2013
Reeditado em 20/01/2015
Código do texto: T4288502
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