A Ver Navios....
[O triste fim de Policarpo Quaresma]
Era noite ainda quando o velho navio sentiu descochar as suas amarras. Nem a pesada âncora deu conta. Uma grotesca tempestade o arrasta em portentosos vagalhões, arremessando-o à praia.
Amanhece e um gigante monumento de aço, com mais de 62 metros de comprimento está lá, quase aprumado, plantado na areia como se fosse zarpar.
Aquela fortuita coisa, digere logo a atenção de centenas de pessoas que correm para lá, curiosas e espantadas.
Na proa e na popa, lia-se em letras grandes, já quase apagadas, o nome da embarcação: Policarpo Quaresma.
Com a proa apontada para o mar, parecia aflito pedindo ajuda, porém, as inconstantes marolas sequer tocavam a ponta do seu casco. Estava ali na areia, a mesma areia que tantas vezes o viu passar e desaparecer na curvatura do mar.
Sua quilha, peito de águia, comprimida sobre o chão, nunca mais singraria aquelas águas. Depois de intermináveis conversas que duraram alguns dias, a sorte foi lançada. Numa tarde vieram uns homens com suas marretas, maçaricos e serras e o retalharam como boi no matadouro! Só retiraram intato de suas entranhas, o enorme braço de aço em forma de pás. Motor, ele já não possuía há tempo. O restante virou mesmo sucata de segunda.
Foi sem dúvida um triste desfecho para quem durante décadas enfrentara tormentas e madrugadas frias,mas sempre trazendo para o cais, os seus marujos, o seu capitão, além de toda carga. Todos, sãos e salvos.
Penso caro leitor, que poderiam tê-lo de alguma forma poupado desse vexame. Poderiam relançá-lo ao mar e afundá-lo, como é de costume na maior parte das vezes. Serviria ainda por muito tempo de moradia aos peixes, até que os vermes do mar o consumissem para sempre.
Sim, poderiam dar-lhe um fim honroso, digno das boas embarcações, mas quis o destino talvez, por causa do nome que carregava, imputar-lhe também este triste fim.
Nota:
Homenagem ao navio originalmente chamado: Carl Hoepcke, um luxuoso navio de passageiros, de origem alemã, na época fundeado em Santa Catarina. Aquele que encantou por décadas os Florianopolitanos, teve a sua trajetória encerrada por causa de um incêndio ocorrido em 27 de setembro de 1956. Depois de uma reforma, acabou sendo vendido e transformado em cargueiro. Passando por vários donos, acabou em Santos, São Paulo, como Navio Recreio-Boate, que ficava fundeado do outro lado, na praia do Góes.
Em 26 de fevereiro de 1971, aconteceu o incidente, vindo encalhar na ponta da praia em Santos, a 100 metros da Avenida Bartolomeu de Gusmão.
Com as inconstâncias do lugar, por causa das marés, é possível ainda hoje ver partes do seu casco que ainda jazem nas escuras areias da ponta da praia.
JAL- SBC-SP.
12/05/2013