Estilo Drama
Como é linda essa morena! Morena convencida, menina perfeita pra mim, com aquele jeito espontâneo, lindo, de moleca, carregado de uma inocência quase indecente. Foi o que me fez paralisar. Eu praguejava sobre a solidão dos recentes dias, queixava-me do céu apagado e dos instantes de descrença. Quando a vi surgir, não sei o que me chamou mais atenção. Com certeza inclui-se inteligência, razão e legitimidade. Poderiam ser também os cabelos bem negros cacheados, volumosos e cheios de vida, que brilhavam, balançavam ao sopro do vento e acompanhavam o som do mar. Teve a graça do sorriso, formado por dentes alinhados, alvos como as nuvens de abril, e uma boca discreta, sem batom e convidativa. Não me esqueço da pele bronzeada, da cor e o sabor de doce de leite, com uma marquinha suave do sutiã, indicando que aquela tez o sol não castiga, contempla. Apaixonei-me pelas sobrancelhas bem traçadas, o nariz delicado, as mãos suaves e macias (comprovado com o seu toque com a minha pele) e a sua maneira de chamar meu nome. Encantei-me com suas pernas tesas, fortes, objetos de admiração e disputas, retratadas em pinturas impressionistas, homenageadas com poesias românticas e sonhadas nas canções dos amantes.
Impossível especificar o momento que ela chegou ao meu coração. Com tantos atributos, de corpo e elegância, como o vestido azul, deslizando aprazivelmente pelas coxas torneadas, seu salto alto, sustentando aquela estrutura magnífica e chamando a atenção enquanto passava. Digo isso por vergonha, de assumir que fora desde o primeiro milésimo que a vi, vindo em minha direção, mostrando simpatia, desejando-me boa noite, e indicando o prazer por me conhecer (se fosse verdade...). Com certeza alguém era dela, pensei. Olhos tão belos não estariam desacompanhados. E qual não foi a surpresa saber que não havia próximo: “Encontrei a convencida da minha vida!”.
Mas que desvario é esse que me pegou sobremaneira? Fez-me de volta adolescente, apaixonado por um sorriso, um olhar provocante que nem sei se era comigo (como eu queria que fosse), criando angústia e outra coisa ruim. Saibam, sentia-me provocado com a dona do vestido azul, pois atiçava-me com aquela voz e eu acreditava. Tentar conquistá-la a todo custo causaria seu afastamento de mim. Entretanto, só queria mais um pouco dessa presença doce morena.
Uma hora da manhã. Sentado neste banco gelado de saguão vazio do aeroporto, refaço minha jornada por estes 8 dias de Salvador. Não esperava que terminasse assim, comigo cabisbaixo, desolado maldizendo o fim. Imaginava-me apenas cansado, com desejo da minha casa e a sensação de dever cumprido. Vontade da minha confortável cama. Mas eis que a Bahia sempre prega peças.
Ah, se não fosse por ela, eu não estaria, aqui e agora, lamentando meus derradeiros minutos em Salvador. Muito menos teria motivos para arquitetar um plano de fuga rumo à Amaralina nos próximos minutos. Primeiro liberto-me desta sala de embarque despretensiosa, corro pelo bambuzal, sob a lua fria e com a trilha sonora das folhas e depois trafego insano pela avenida Paralela em busca de um táxi – ônibus ou jegue. Por fim a orla e o seu apartamento. Contudo, chegando lá, o que digo, sem parecer impróprio?
Recebo algumas mensagens de texto dela, enquanto estou divagando nestes pensamentos de cérebro compassado e coração acelerado. Respondo, porém pensando em telefoná-la e ter mais uma oportunidade de ouvir sua voz. Será que tento? Demonstro? Faço o papel de bobo que a paixão nos faz acreditar? Mas como, se a conheço somente a pouco mais de 24 horas?
Será ela (como a bela canção do Tom Jobim) minha Teresa da Praia? “Tereza é da praia, não é de ninguém. Não pode ser tua, nem minha também”. Encaro o telefone, respiro fundo, agarro-o com firmeza e vou errante saber se esse será um fim, ou apenas o começo. Decido por telefonar e ou vir mais uma vez agradável voz. E seja o que a morena quiser...