Mães – exatas aquelas.
Por Carlos Sena


Deve ser duro o dia das mães para muitas delas. Exatas aquelas que a vida lhes fez perder dos filhos por motivos que nem mesmo elas sabem; exatas aquelas para quem a morte do filho por bala perdida as mantem mortas; exatas aquelas para quem o trânsito louco e cheio de alcoolemia dizimou seus filhos; exatas aquelas para quem as drogas, especialmente o craque, dizimaram seus filhos tornando-os morto-vivo sob a égide da fumaça que transforma os sonhos dos seus filhos em pesadelos sem volta; exatas aquelas para quem a morte dos seus filhos foi patrocinada por policiais despreparados; exatas aquelas para quem os filhos foram mortos nas delegacias infectadas pelo vírus do Estado despreparado que ao invés de zelar pelos cidadãos os expõe à violência institucionalizada; exatas aquelas para quem os filhos estão presos e já cumpriram o que devem a justiça, mas eles mofam na cadeia porque a justiça do país não liga pra pobre e preto; exatas aquelas... Aquelas para quem “Estela” não vira estrela de nenhuma grandeza. Aquelas que no dia das mães poderão cantar no seu canto solitário: “a saudade é arrumar um quarto para um filho que já morreu”... E se contentam olhando as roupas dos filhos que se foram, as fotos dos filhos encarcerados, e a memória que não lhes rouba as imagens do atropelamento, da bala perdida, da justiça suja e encardida...
Mães da Praça de Maio. Mães do choro chorado sem lágrimas. Mães do retrato sem foto, da foto sem traço, do traço sem cor, da cor sem tom. Mães do tom em “dó” da cantiga de ninar destroçada pela vida bandida, irônica afônica. Mães do rosário na mão a pedir; mães que choram no silêncio da noite, como que imaginando que seu choro redime a ausência do filho que se perdeu nas avenidas do mundo... Mães do terço, do berço, do sexto sentido e do sentido sem texto. Lá fora corre uma esperança sobranceira que se esconde debaixo do horizonte... Fonte que a vida renova cheia de energia como que a pedir de Nossa Senhora a benção, sem saber que lá de cima ela já benzia... Mães, exatas aquelas...