O ÚLTIMO PRESENTE

Maio me lembra o último presente que tive a oportunidade de oferecer a minha mãe.
Eu tinha então onze anos e alguns meses, era mês de maio, e minha vó, convidou-me: " Lena, vamos até a Lapa, preciso comprar umas coisas e ai, você aproveita e compra o presente para sua mãe." Adorava  ir a esse bairro, para mim era um grande acontecimento. Íamos de trem, minha imaginação voava, quando conseguia sentar-me em um banco perto da janela. Pela vidraça do trem, seguia eu, avistando cada casa, com seus varais cheios de roupas a secar ao sol. Sempre tive muita imaginação, creio até que, por isso gosto tanto de escrever. Ficava a pensar, quem morava em cada uma daquelas casas que ficavam, à beira da linha do trem. E de quem eram as roupas que coloridas, balançavam ao sabor do vento. Me lembro que criava vários personagens, para cada roupa que via estendida.
Quando enfim, desembarcávamos na Lapa, lá ia eu, agarrada a mão de minha vó Carmela.
Lugar imenso e cheio de gente era aquele, para uma menina que estava acostumada com o sossego da modesta vila que morava, onde conhecia  todas as pessoas, que passavam pelas poucas ruas do vilarejo.
Na Lapa me via aturdida, não sabia o que olhar, se para as pessoas, que sempre me despertaram interesse, ou se para as lojas, repletas de coisas de todos os gêneros, tao diferentes do armazém simples do meu vô Totó, único em nossa Vila.
O bairro da Lapa, tinha algo que eu não esqueço, as pastelarias, e um pastel de palmito delicioso, minha vó ainda pedia um caldo de cana, nunca me esqueci do sabor daquele pastel.
Bom, mas voltando ao presente, aquele ano, tínhamos pensado eu e minha vó, em presentear minha Mãe, com uma bolsa.
E então, procuramos e encontramos uma, da qual  até hoje me lembro tão bem, como se ela estivesse aqui, à minha frente.
Era de ráfia branca, com alças em couro marrom, era uma bolsa grande, com duas divisões internas.
Eu gostei dela logo de cara, e minha vó também. Ela veio embalada em lindo papel de presente.
O duro foi esperar até chegar o dia das Mães, para dar o presente para a minha. Eu contava as horas, e parece que elas tinham esticado de 60 para 120 minutos, pois não passavam.
Na semana do dia das mães, fiz na escola, um coração de cartolina branca, com um furo na lateral, por onde passei uma fita, e dei um lacinho. Nele escrevi, o amor e carinho que tinha por minha Mãe. Ele ficou muito mal recortado, pois eu nunca fui boa em arte alguma. Minha caligrafia, até hoje é um horror, e naquele tempo não era melhor. O coitado não ficou nenhuma obra de arte, nem posso dizer que ficou bonito. Ao final o que consegui fazer foi, um coração meio torto, escrito com letras que mais pareciam garranchos. Mas, logo depois que minha Mãe morreu, olhando as coisas em uma gaveta que era dela, achei o coração de cartolina branca, com o lacinho cor de rosa.
Estava guardado com todo cuidado, entre seus pertences.
E de lá pra cá, ele vem sendo guardado por mim, com todo zêlo e carinho.
E a bolsa de ráfia branca, com tiras em couro marrom, levou anos, para eu ter coragem de me afastar dela, um dia, dei-a para minha tia,  irmã de minha mãe, para que a usasse. A bolsa estava nova,  minha mãe, usou-a poucas vêzes, já que a ganhou em maio e partiu no mesmo ano em julho.
Fico pensando que, nunca sabemos, quando será, o último presente que daremos a alguém.

(Imagem: Lenapena- NY)

Lenapena
Enviado por Lenapena em 10/05/2013
Reeditado em 10/05/2013
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