VENDENDO CONVERSA

VENDENDO CONVERSA

Hoje pela manhã, em uma longa caminhada de reflexões pela orla, pisando na areia (eu e o Beto - Cãozinho), fiquei pensando em literalmente "Vender Conversa"... Não estranhe não... Muita gente gosta de "jogar conversa fora"... Por que não vendê-la?

Acho um desperdício simplesmente "jogar conversa fora".

Assim, sento em um banco do calçadão, instalo uma placa somente com os dizeres "Vendo Conversa", R$5,00 por 15 minutos e o cliente escolhe o assunto. E não tem "Conversa Fiada", tudo assunto sério. Está caro? Está bem, pode pagar depois, e, se “não gostar do papo”, não precisa pagar... O “bom de papo” sabe que irá agradar, promete que não será um simples “bate papo” ou “papo furado”, e, portanto certamente receberá pelo seu “serviço”! E lembrando também que, de repente, uma boa conversa poderia lhe mudar o rumo da vida!

Não tinha a mulher que “escrevia cartas” lá na Central do Brasil? Algo semelhante, só que aqui seriam atendidos tanto “letrados” como analfabetos.

A vantagem é que não depende de ponto, não depende de capital (só o intelectual), onde você for leva consigo "a loja".

Acho que tem muita gente que quer conversar e não tem com quem...

Fiquei imaginando as senhoras, já muito mais experientes, curiosas, querendo ver que negócio é esse de pagar para conversar. Os jovens rindo, as meninotas com seus segredos, os bobões que demoram muito a amadurecer, pessoas mais intelectualizadas com as quais podemos até aprender um pouco mais. Tem aqueles que posam de sábios, filósofos, os que nitidamente demonstram aquela falsa erudição, querem falar de vinhos, sinfônicas, lugares, mas que se desvanece nos primeiros minutos de “prosa”. Enfim, o "naipe" da clientela é de tudo quanto é jeito.

A concorrência pode até começar a aparecer, mas, o único perigo é ter mais assunto que você, ou ser mais afeito à dramaticidades e partir para chamar a atenção como se estivesse atraindo idiotas na Praça da Sé, ou efetivamente tem muita experiência na vida e sabe compartilhar durante a conversa. Poderá até aparecer a dupla onde o auxiliar só informa depois que a conversa será com um mudo, assim, precisa conhecer mímica, a linguagem dos sinais. Mas aí é só mudar de ponto... Tem freguês “prá” todo mundo. Só lembrando que se for para Minas Gerais, lá o verbo é “prosear”... Assim a placa desse ser “Vende-se Prosa” ou “Vem prosear comigo”, sem esquecer o “dedinho de prosa”. Ou seja, melhor sempre obedecer as nuanças e culturas regionais para ser melhor sucedido. Um “Bah! Tchê” no Sul, ou o “seu minino!” no Nordeste pode não ter o sotaque gaúcho ou nordestino, mas certamente já facilita só pela intenção.

E mais, não precisa nada para embrulhar o produto vendido... a gente vai, na verdade, “embrulhando todo mundo”, “levando na conversa” ou ainda “ensaboando o sapo”.

Poderia até dar emprego, por exemplo, para uma secretária: Ela fica arrecadando o pagamento e anotaria antecipadamente os dados da (o) cliente, o assunto escolhido, cuida da agenda, etc... , para facilitar nos “rapa-pés”, “rasgas sedas e lantejoulas” iniciais, assim, o cliente não perde tempo e já vamos “direto ao assunto”!

Nesse negócio, poderia continuar a conversa em outro momento, atendendo em domicílio alguma conversa mais estreita ou mesmo as mais longas. A secretária estaria lá para o agendamento.

Bom, aí, tem que ter a precaução para não se envolver e ”cair na lábia” de alguma cliente necessitada, pois, como em tudo na vida, ”onde entra muié, a coisa começa a andar prá trás”, assim, dizia o velho ditado:

Quem quiser ter vida longa,

Fuja sempre que puder,

De polícia, de boticário,

Melão, pepino e mulher.

E depois, toda mulher, tem uma “poderosa força de persuasão” e grande tino em ver suas necessidades resolvidas (e se não resolve “não tem dúvida em abandonar o barco”), além da forte componente que é o sentimento de posse. Ela, depois de certo tempo, pensa que é dona do outro: define o tempo que você saí, quer saber onde foi, quem são seus amigos, programa seu tempo com compromissos que não são seus, não pode mais tomar cervejinha, assistir ao futebol, e vai por aí afora... O egoísmo então dá para ver sair “pelas ventanas”, afasta qualquer um de perto, divide a família, “espanta” os amigos, os vizinhos, todos são ameaça ao seu bem estar. Nepotismo então, nem se fale, além de tudo quer que ajude a sogra, o cunhado, cunhada, sobrinhos dela, etc...... Mas... Tá vendo, já está atrapalhando o principal motivo desse “nosso papo”...

Voltando ao tema, tenho plena certeza que em pouco tempo eu estaria ampliando o negócio, pois, invariavelmente, o cliente gosta de conversar e aí, seria necessário contratar mais “conversadores” (caras bons de papo), contratados por hora e talvez até, divididos por tipo de assunto, ou especializados em “determinados tipos de clientes”... e tem cada “peça rara” nesse mundo... Bom, tem que “ter jogo de cintura” e estar preparado para tudo.

O prazer de conversar vai além da remuneração, que certamente será visto aumentando gradativamente. O negócio funciona até como se fosse o antigo confessionário das igrejas, apenas que lá “pro” padre, ”se contam coisas feias”, e na conversa despreocupada, falamos de coisas boas, quer dizer, pode até ter clientes que queiram “se confessar”, mas, aí todo cuidado seria pouco, para não se envolver em segredos que não nos dizem respeito. Pode ter os traidores e traidoras, os pais que não assumiram, os jovens que se drogam, as meninas que se prostituem, as velhas que escondem suas coisas das noras, os velhos que ficam na praia “babando, as meninas”, com “um olho no gato outro no queijo”, e nisso, lembrando as brincadeiras e Cantigas de Roda...

Lá em cima daquele morro,

Tem um velho relojoeiro,

Quando vê perna de moça,

Faz relógios sem ponteiro.

E tem até o cara que chega e pede para ficar conversando o dia todo “com a sogra dele”, paga até em dobro... enfim, terá de tudo nesse negócio de “vender conversa”... Mas acho que “valerá a pena”. Então, com muito ânimo, vou começar já meu novo negócio, e, "pegando o gancho" dos comentários abaixo, porque não pensar até em franquia?

Bom, a “conversa tá boa” e você ainda não me pagou... lembre-se, na tabuleta está escrito que aqui “não se vende conversa fiada”. Quer conversar mais, por favor, entre novamente no final da fila, veja, tem muitos esperando, cada qual a sua vez e você já usou mais que seus dez minutos... Nem comecei direito o negócio e já quer me levar à falência?!

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Insight

Praia Grande, 05/05/2013

MARCO ANTONIO PEREIRA
Enviado por MARCO ANTONIO PEREIRA em 05/05/2013
Reeditado em 05/05/2013
Código do texto: T4275047
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