O Homem do Futuro

Passamos bastante tempo juntos. Percorremos caminhos que, no plano físico, possivelmente não serão trilhados pelos que vieram depois de nós. Porque são caminhos que já estarão modificados.

No plano espiritual é outra história. Ainda que alguma coisa material possa influir. A vida digital, por exemplo. Ou a que está sujeita às algemas da informática ou da tecnologia. As imposições, modulações decorrentes das frequentes inovações tecnológicas. Até que ponto isso interfere com os nossos sentimentos?

Ainda há lugar para a candura, meiguice, inocência? Ou seriam elas atributos do mundo infantil?

Poderemos estar um dia – ou talvez já estejamos – sob os efeitos da pulverização dos nossos sentimentos, provocados pela modificação de hábitos, estilos de vida, de raciocínio, sugeridos por uma modernização incontrolável e inexorável.

O homem do futuro será mais frio? Mas nós já somos o homem do futuro. Para quem viveu, digamos, no século XVI. Por outro lado, as sociedades de avanço tecnológico mais acentuado dispõem de homens essencialmente diferentes em relação aos do mundo subdesenvolvido? Ou será que os primeiros são muito mais controlados, monitorados, vigiados que os segundos? E que por isso mesmo acham-se sob um estado de opressão substancialmente maior que o experimentado pelos que habitam o chamado Terceiro Mundo? Talvez por aí se expliquem também os frequentes atentados em países como os Estados Unidos, ou outros do mundo desenvolvido, cometidos por cidadãos lá nascidos ou estrangeiros lá educados. O que é pouco comum em países localizados abaixo da Linha do Equador.

Independentemente do ponto de vista político, político-fanático-religioso e outros, esse comportamento pode significar uma válvula de escape para o cidadão que se sente oprimido por um sistema que o asfixia, em troca de facilidades e modernizações sempre atualizadas, cujo grau de importância e necessidade a vida agitada e estressada não lhe permite uma acurada aferição.

Chegávamos a levar um ano ou mais para irmos de determinado lugar a outro por mar. Hoje levamos um mês ou menos para percorrer a mesma distância marítima. Somos capazes de relacionar vários exemplos da importância do telefone celular. E dizer que sem ele ficaríamos por um bom tempo esperando pelo socorro para o nosso carro enguiçado no meio da estrada. Mas podemos também imaginar que, ainda que não houvesse modernos navios, viajaríamos de qualquer maneira e o destino seria do mesmo modo alcançado. Ou nos comunicaríamos de qualquer jeito, como sempre nos comunicamos, ainda que sem celular. Só que não se pode interferir com o progresso. Por ele ser inevitável. Por estar meio que embutido no homem. Como também nele estarão embutidas outras grandiosidades. A questão é saber quais as que permitiremos que sejamos por elas absorvidos.

O homem é um ser em transformação. Que tem maior visibilidade no plano físico. No entanto, com a frequência de alterações produzidas com a avassaladora velocidade do mundo tecnológico, talvez agora possamos dizer, com mais ênfase, que as características básicas do homem cognitivo estão também se modificando. Embora achemos que temos razões para acreditar que elas nunca deixarão de serem as mesmas, isto é, aquelas com que chegamos ao mundo. E que estão apenas ofuscadas ou sublimadas pela impossibilidade que tem o homem de se libertar da prisão do mundo moderno. Para que ele possa ter condição de avaliar se tudo o que o cerca hoje – e depois, amanhã – é de fato essencial à sua existência.

Rio, 02/05/2013

Aluizio Rezende
Enviado por Aluizio Rezende em 03/05/2013
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