O meu único amigo
Já o conheço a tanto tempo que não me lembro quando o conheci. Só sei que desde pequena ele sempre esteve por perto para me socorrer. Crescemos juntos, frequentamos a mesma escola, as mesmas festas e lugares.
Quando comecei a namorar o João, ele era o meu confidente e meu conselheiro. Sempre esteve pronto pra me defender seja lá de quem fosse, ele sempre esteve comigo nos melhores momentos e nunca me faltou nos momentos difíceis.
É claro que a recíproca é verdadeira. Quando ele se apaixonou por uma garota de outro bairro, fui eu quem fez o meio de campo para que ele pudesse marcar um encontro com ela, fui eu que ajudei na elaboração de um bilhete apaixonado, e também fui eu quem o consolou quando o namoro acabou e ele ficou arrasado.
Trinta e tantos anos depois ainda continuamos amigos. Casei, tive filhos, descasei, sofri muito e foi ele quem me socorreu. Quando ele casou eu fui sua madrinha de casamento, mas sempre reservei o meu lugar de amiga, sem interferir na sua vida de casado assim como ele se reservou e não interferiu no meu casamento. Conheço seus filhos assim como conheço os dele, mas nada além disso.
Se hoje sou feliz mesmo vivendo só, devo a essa amizade. E sei que se ele consegue se manter feliz no seu casamento, mesmo com tantos percalços deve isso a nossa amizade.
Para que possam entender, é preciso que eu explique o que se passa na vida do meu amigo. Desde jovem, ele sempre foi apaixonado por essa que hoje é sua esposa. Durante muitos anos ele tentou em vão conseguir conquistar o seu amor. Finalmente ele conseguiu. Namoraram, se apaixonaram, casaram e tiveram filhos.
Mas na vida real a história não termina com um “...e viveram felizes para sempre”. Com o tempo, ela se tornou fria e desinteressada pelo companheiro. Ele sofreu muito, pensou que ela tinha outro, quase ficou louco. Passou noites em claro, armou ciladas, perseguiu mas nada descobriu. Hoje ele entende que ela não quer ninguém, nem ele.
Ele continua apaixonado pela esposa, continua na tentativa de reconquistar sua amada, mas ela é indiferente a tudo que ele faz para conquistá-la, e todos os dias é sempre a mesma coisa, bom dia, boa tarde, boa noite, estou com dor de cabeça e só. Sem carinho e sem amor. É a mesma vida vazia a dois.
É por isso que quando a solidão nos maltrata, nos encontramos. Saímos, bebemos e curtimos. Esquecemo-nos de tudo e de todos, e quando a chama da nossa carne nos queima, nós nos amamos, nos entregamos.
E no dia seguinte, como sempre, a amizade continua.